Belíssimo filme. De uma história à beira do insustentável — um professor que pede aos seus alunos que façam «favores em cadeia» a três pessoas que necessitem de auxílio —, Mimi Leder constrói um tecido narrativo que, à boa maneira da tradição melodramática (Minnelli, Cukor, Sirk, etc.), passa por todas as ambivalências das relações humanas. Ou como uma fábula sobre a decomposição simbólica dos laços sociais se transfigura num retrato do (des)conhecimento com que nos aproximamos dos outros. Além do mais, uma visão inesperada, e prudentemente desencantada, de uma Las Vegas que fica, literalmente, para além do brilho dos néons.
Delicado na composição do espaço e na gestão dos tempos e emoções, «Favores em Cadeia» possui, além do mais, um elenco de luxo onde não se sabe bem quem deveremos destacar.
* Kevin Spacey — recusando a faceta mais óbvia da sua postura algo cínica, compõe uma personagem de grande e paradoxal vulnerabilidade que passa pela subtil transfiguração de um corpo marcado pela sua própria história trágica.

* Helen Hunt — um renovado milagre; para simplificar, digamos que em H.H. convergem as capacidades de transfiguração e emoção (e também de contenção, quando tal se exige) de Katharine Hepburn e Meryl Streep. Tudo com aquela serenidade radical de quem aceita toda a crueldade que na câmara se possa investir.
* Haley Joel Osment — o pequeno prodígio de «O Sexto Sentido» é mais do que um acidente: é um actor de corpo inteiro, capaz das mais requintadas «nuances» de pose, olhar e sugestão emocional (vejam o seu diálogo com Spacey, quando vai ao quadro). Um actor adulto, se tal expressão pode fazer sentido — e um sentido que não seja paternalista.
[Crítica originalmente publicada a 9 de Fevereiro de 2001 no site Cinema2000]
Título original: Pay It Forward Realizador: Mimi Leder Intérpretes: Kevin Spacey, Helen Hunt, Haley Joel Osment, Jay Mohr, Angie Dickinson EUA, 2000

