Metropolis 92

Um dia, enquanto me lamuriava por não poder viajar tanto como gostaria, um amigo olhou para mim e disse-me: “Já reparaste que existem tantas outras formas de viajar, mesmo sem comprares um lugar num avião ou num comboio?” Naquele momento, aquela frase soou-me a cliché e não parecia fazer sentido, nem tão pouco sossegou a minha alma inquieta. Precisei de algum tempo para entender as entrelinhas e perceber que qualquer tipo de arte é um bilhete de ida para uma outra parte do planeta, o combustível para o complexo e maravilhoso mundo da imaginação, ou a portagem para o imenso universo do coração de alguém. Não descurando todas as outras artes, o cinema continua a ser o meio de transporte mais sónico e a maior das escolas do poder da vida.

Este ano, apertemos, então, e mais uma vez, o cinto e preparemo-nos para o encerramento da grande viagem cinematográfica que terminará já no dia 12 de março. A cerimónia da atribuição dos Óscares “fecha” a grande época de prémios e todo o glamour irá invadir o Dolby Theatre em Hollywood, para a celebração da grande festa do cinema, onde estará, pela primeira vez, um filme português entre os principais nomeados. A corrida parece renhida nas linhas da frente dos prémios mais cobiçados, com muita expectativa na resolução para as categorias de Melhor Filme, Melhor Actor, Melhor Atriz, Melhor Realizador, mas, na verdade, quem sempre chega a bom porto somos nós, os que viajamos em primeira classe no comboio do público, senão vejamos: viajamos até Pandora para conhecer o mais bonito dos planetas, voltamos a sobrevoar os céus com o capitão Pete “Maverick” Mitchell mais de 30 anos depois, alucinamos com a família Wang numa lavandaria entre duas (ou mais) dimensões, recuamos no tempo para conhecer a vida do pequeno Sammy Fableman, que se tornará num dos melhores realizadores de sempre, perdemos a noção do tempo com a incrível e descompensada maestrina Tár, encantamo-nos com as paisagens verdejantes de uma ilha isolada ao longo da Irlanda enquanto analisamos os meandros da amizade verdadeira, olhamos para a primeira guerra mundial de uma nova e crua perspetiva, e vendemos gelo, feito numa casa no alto de uma montanha gelada, na aldeia para a qual nos atiramos, literalmente, de paraquedas.

Neste comboio, que passa todos os anos, personagens carismáticas encontramse no bar, realizadores conversam na plataforma, as carruagens preparam os lugares à janela para as paisagens paradisíacas que se seguem, os chefes de estação encaminham as equipas de produção e técnicas, e até os distribuidores sobem a bordo, porque nesta viagem não fica ninguém de fora. Apertemos os cintos novamente. A viagem vai prosseguir e promete continuar a surpreender todos os que compraram bilhete, e mesmo que o comboio não saia da plataforma, já valeu a pena, porque a maior das viagens acontecerá sempre dentro de cadaum de nós.

SARA AFONSO
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