«Manas» marca a estreia da realizadora brasileira Marianna Brennand na ficção, que traz até nós um filme que quer quebrar silêncios e que pode ser uma ferramenta muito poderosa para transformar a sociedade e a política. «Manas» veio até à documentarista através de uma conversa com a artista Fafá de Belém, em 2013, e, desde então, o trabalho de pesquisa e de reunião de condições para filmar foi um trabalho desafiante, mas que não podia ficar em silêncio.
Nesta conversa com a revista Metropolis, Marianna Brennand abre o seu coração para falar do que muitas crianças numa zona ribeirinha da Amazónia, na ilha do Marajó, não podem falar. Coloca a sua sensibilidade ao serviço de um tema de abusos que ainda hoje persistem e que só um movimento coletivo, de empatia e consciência global, poderá travar um dia.
«Fiz este filme para as “manas”, para que elas se sintam vistas, respeitadas, compreendidas e encorajadas a quebrar os seus silêncios», partilha a realizadora sobrinha-neta do famoso artista plástico brasileiro, Francisco Brennand. Depois de muitos anos a fazer documentários, a realizadora oriunda do nordeste brasileiro convida todos os que tiverem a coragem de ver «Manas» a colocarem-se no lugar do outro, no lugar de crianças e jovens indefesas que enfrentam abusos e abusadores muitas vezes dentro das próprias famílias. Nesse sentido, este é um filme para todos, para mulheres e homens também. «É importante que os homens vejam o filme. Eles são, na maior parte das vezes, os violentadores e este é um filme que é sobre uma violência cometida por homens contra meninas e mulheres. É meu desejo que «Manas» sensibilize todas as pessoas», confessa.
A cineasta, de passagem por Lisboa para a apresentação da longa-metragem, quer que este seu projeto funcione como “um despertar”. Um despertar colectivo que possa ajudar outras pessoas a falarem, a terem coragem para pedir ajuda e para perceberem quando estão a ser vítimas de qualquer tipo de violência.

«Manas», assim chamado em todos os países onde estreou ou vai estrear, deve o nome ao termo usado por mulheres de muitas comunidades na Amazónia e relata a história de Marcielle (Jamilli Correa), uma menina de 13 anos, que vive nas margens do Amazonas, na ilha do Marajó, com o pai, a mãe (grávida) e os três irmãos. Aqui, vivem do que a Natureza oferece e não lhes restam muitas oportunidades para um futuro alternativo. Podem apenas sonhar que um dia vão casar com um “homem bom” – como a sua irmã Cláudia que foi embora. Infelizmente, Marcielle percebe cedo demais que a sua realidade não é tão pura como parece e, à medida que amadurece, o mundo que conhecia começa a ruir e a sua liberdade enquanto mulher é posta em causa pelo pior dos abusos. Para que a sua irmã mais nova não passe pelo mesmo, a jovem vai ter de enfrentar os seus medos e mudar para sempre o destino da sua família.
Com a participação de atores brasileiros profissionais, como Fátima Macedo (Danielle, a mãe), Rômulo Braga (Marcílio, o pai) e Dira Paes (a delegada Aretha), é no entanto a protagonista Jamilli Correa, que cativa o nosso fascínio e o maior dos respeitos. Sem qualquer experiência prévia em representação, a câmara apaixona-se instantaneamente por ela, e da realizadora chegam apenas os melhores elogios: «A Jamilli foi um verdadeiro encontro, uma revelação. Eu costumo brincar que ela deve ter sido atriz noutras vidas. O que fizemos foi destravar algo que já estava lá — apenas trazer à tona essa grande atriz que ela já é. A Jamilli é, de facto, uma força da natureza e percebemos isso logo nos testes e no início da preparação, mas foi em cena, no momento certo, que ela se revelou por completo. Tem uma inteligência emocional e uma atitude cénica impressionantes.»
«Manas» estreia hoje, dia 21 de agosto, e poderá ler a entrevista a Marianna Brennand na íntegra, na próxima edição da revista METROPOLIS.

