Page 174 - Revista Metropolis nº122
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de Anna Mary Scott Robbins (em especial, o figura de ponte entre tradição aristocrática e
deslumbrante vestido encarnado, de corte em viés, modernidade cultural. No entanto, sinto que
usado por Lady Mary) ficarão, com certeza, como Froushan nem sempre consegue captar a essência
referência na História do cinema. inteira de Coward. Em primeiro lugar, há uma certa
suavização das arestas: Coward era mais mordaz,
Mas houve fraquezas. Arty Froushan interpreta o mais ácido, mais sugestivo; o seu wit revestia-se da
complexo e exuberante Noël Coward, figura literária ironia refinada de um Oscar Wilde para o século XX.
e cultural britânica reconhecida não só pela sua No filme, Coward é apresentado num tom bastante
obra (peças, música e letras), mas também pelo seu polido, amigável em demasia a servir mais como
estilo muito próprio e presença refinada: a persona catalisador moral/social para Mary do que como
de dandy, de espírito rápido, sofisticado, sarcástico, personagem autónomo. Embora Froushan se tenha
marcado por uma certa ambiguidade sexual e pela esforçado (chegou a aprender a tocar piano para o
sua aguda inteligência social. O filme tenta mostrar papel) há momentos em que a encenação de Coward
momentos altos dessa persona: Coward aparece parece idealizada: mais decoração que tumulto de
no teatro, interage com os Crawley, ajuda Mary a sombras que realmente existiram na figura real. No
superar a exclusão social e inspira-se no divórcio fundo, Coward a ser representado como de facto o
dela para dramatizar uma das suas mais populares era, deveria estar lá para introduzir a verve e humor
comédias de costumes, “Private Lifes”. Em suma, corrosivo da figura da irrepetível Violet (Maggie
gestos que fazem sentido para o seu papel enquanto Smith), agora ausente.
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