Page 179 - Revista Metropolis nº122
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NOUVELLE
VAGUE
TÍTULO ORIGINAL
Nouvelle Vague
REALIZAÇÃO
Richard Linklater
ELENCO
Zoey Deutch
Guillaume Marbeck
Aubry Dulli
ORIGEM
EUA, França
DURAÇÃO
105 min.
ANO
2025
Está muito para além do tributo a Godard, é mais do Pelo meio, encenam-se conversas de cafés e surgem
que uma carta de amor a «O Acossado» e seguramente figuras mascote da Nouvelle Vague: de Rohmer a
é tudo menos uma caricatura à Nouvelle Vague. Esta Rivette, passando por Chabrol e Truffaut, não faltando
variação dos bastidores da estreia no cinema de Jean- Godard pronunciar a famosa frase :“basta uma arma
Luc Godard tem, porém, de forma bem assumida, e uma rapariga para fazer um filme”. É claro que
um travo de homenagem, uma vénia elegante e tudo isso parece missa para o vigário cinéfilo mas
muito, mas mesmo muito humor perante aquele Linklater sabe ser acessível a quem não está dentro
movimento de cineasta e críticos. Um tipo de humor do léxico desta revolução do cinema francês, mesmo
leve e sinceramente culto. Os atores não estão a imitar que surja uma série de deliciosos piscares-de-olho a
Belmondo, Godard e Jean Seberg, estão antes a emular quem é fã deste cinema, quase em estilo de cultura
um estado de espírito. Voilá, a tal leveza doce, coisa de pop, sobretudo pelo estilo “nouvelle vague” da sua
fã, sem problemas. cinematografia e da frescura daquele preto e branco,
O filme começa com o jovem Godard decido a começar perfeito, perfeitíssimo para gerir o caos do “souvenir”.
a filmar. Da redação da revista Cahiers du Cinema a Uma gestão, sublinhe-se, cheia de leveza.
um plateau não vai um passo, mas sim um encontro Ao contrário de «Godard, o Terrível», de Michel
com Georges de Beauregard, produtor fundamental Hazanavicius, não há escárnio nem recriação política,
da “Nova Vaga”. Um Godard cheio de raça, garra e com apenas um respeito orgânico. Aliás, um respeito que é
vontade de inovar. Sabe bem o que quer: fazer um tudo menos paternalista, inclusive quando não evita
filme em Paris com Jean Seberg, apostar num ator esse fervor de iconização da figura.
improvável, o jovem Jean-Paul Belmondo e apostar O grande truque ou trunfo do filme é a ostentação de
num tratamento escrito por ele e pelo amigo Truffaut uma cinéfila ampla, a tal que não deixa de fora quem
que conta a história de um jovem aspirante a gangster. não é do clube do Godard da Nouvelle Vague. Linklater
As filmagens começam e tudo parece fluir de forma não está a ser enciclopédico, nada disso: está a sugerir
diferente: não há propriamente guião, joga-se com curiosidade. E a curiosidade aqui não mata gatos, é
ambiência parisiense dos décors e Godard desafia vital! Não é por acaso que está a ser já trabalhado para
standards da “mise-en-scéne”. E entre Seberg e os Óscares de…Hollywood. Godard ia desatar a rir…
Belmondo surge uma verdadeira química de câmara. RUI PEDRO TENDINHA
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