Depois de ter encantado e vencido o Festival de Veneza, Almodóvar está agora a caminho da temporada dos Óscares com esta primeira longa em língua inglesa entre Nova Iorque e Woodstock com Julianne Moore, Tilda Swinton e John Turturro. Pelo o que já se percebeu, é sobretudo Tilda quem está mais na jogada para nos Globos de Ouro e nos Óscares poder lutar na vaga das melhores atrizes principais, ainda que Julianne Moore seja de uma singular vibração neste melodramalhão sobre cumplicidade feminina com o tema do cancro em fundo e a morte sempre à espreita. Um Almodóvar que não se perde na tradução.

Baseado no romance de 2020 de Sigrid Nunez, “What Are You Going Through”, o filme narra  a história de amizade de duas amigas, Ingrid, escritora de sucesso e Martha, jornalista de guerra do The New York Times. Uma amizade posta à prova quando Martha pede a Ingrid para a acompanhar durante o processo de eutanásia numa casa de campo na zona de Woodstock. O que se segue é a despedida de vida de uma mulher que aprecia os seus últimos momentos em regime de cumplicidade feminina, ela que recusa sofrer com um cancro na fase terminal. Almodóvar aproveita essa premissa para uma reflexão sobre a vida. Exato, é um filme do lado da vida mesmo quando aborda o tema da eutanásia, recusando, paradoxalmente, ser um manifesto de causa, tal como era esse insuflado «Mar Adentro», de Amenábar, em 2004.

O que é particularmente exultante em Pedro Almodávar aqui é o seu jogo de câmara que pede teatro, naturalismo e aquele tom de excesso fatalista tão dele – garante-se que o Inglês não atrapalha. Os diálogos têm o tempo e os tempos certos, um lirismo que vai do trivial ao mais trágico, sempre perto do peso da alma, citando-se Joyce mas parecendo Bergman- sim, milagre supremo! Ajuda, claro, que as atrizes saibam pôr-se à disposição das grandes emoções, mesmo quando o espanhol propõe um pacto cromático frontal com a pintura de Hopper, seja com sol ou com flocos de neve cor-de-rosa. Um espetáculo para os olhos que é de uma beleza rigorosa.

Almodóvar enceta ainda outra conquista: filmar com desplante o cancro e o seu combate – é raro um filme olhá-lo assim tão de frente – e de outro dos seus temas: o pessimismo da geração 60 com o estado do mundo: das alterações climáticas ao fim disto tudo. É um recado de Almodóvar sob a tal capa do melodrama clássico de Sirk (coisa que já vem fazendo há uns tempos…). Um desencanto que, surpresa, serve bem o fatalismo desta tragédia americana. A mãe condenada de Tilda Swinton é uma imensa personagem de cinema.

«The Room Next Door» não estará no panteão das obras-primas de Almodóvar, mas andará lá perto.

Título original: The Room Next Door Realização: Pedro Almodóvar Elenco: Tilda Swinton, Julianne Moore, John Turturro Duração: 107 min. EUA/Espanha, 2024

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