Embora dialogue com a tradição dos pulps da 2ª Guerra, celebrizada nas BDs da DC Comics por “Sargento Rock” e no cinema por filmes de sucesso como « Heróis por Conta Própria» [«Kelly’s Heroes», 1970] e «Canhões de Navarone» (1961), a eletrizante novela gráfica espanhola “O Fotógrafo de Mauthausen” (Gradiva BD) evoca o jornalismo gráfico de autores como o maltês Joe Sacco (“Palestina”). Há uma natureza documental nas suas ilustrações e a sua forma de mapear geopolíticas ao resgatar os bastidores do Holocausto sob uma ótica espanhola. O guião de Salva Rubio ganha uma esplendorosa materialização pictórica na arte de Pedro J. Colombo e Aintzane Landa, que favorece a dinâmica de tensão no texto. Fantasmas do franquismo no imaginário de Espanha dão um colorido sombrio à investigação histórica de Rubio, baseada em fatos reais.

A sua narrativa adota como protagonista Francisco Boix, um fotógrafo ibérico, que é entregue aos nazis pelos franceses, ao ser acusado de transgressor pelas suas crenças comunistas. O mesmo acontece com muitos dos seus companheiros. Dentro da prisão, ele consegue um emprego como assistente de um dos oficiais alemães, Ricken, que também tem talento para a arte pictórica e se interessa em clicar a realidade. O seu foco, entretanto, está no horror: o objeto central das fotos de Ricken são os prisioneiros mortos de várias maneiras. Algumas mortes chegam a ser encenadas por ele, com os cadáveres, a fim de agradar o seu sentido distorcido de estética. Ele é um signo da banalidade do mal. Com a ajuda de outros prisioneiros, Francisco elabora um plano – bastante perigoso – para contrabandear cópias ou negativos das fotografias do seu superior para a Rússia. A sua ideia é informar o mundo exterior sobre o que está acontecer no submundo do hitlerismo.

A abordagem de Rubio para os feitos de Francisco – levados às telas num filme de 2018 da Netflix, com Mario Casas – tem um ónus heroico. O esforço do fotógrafo é acabar com o jugo do Reich sobre a Europa a partir da denúncia dos seus expurgos. O tempo tornou a sua aventura pessoal num marco da resistência, uma vez que os registos fotográficos que ele conseguiu esconder dos nazis servem como evidência (política e criminal) das atrocidades dos líderes alemães. Graças a ele, muitos criminosos de guerra foram condenados. Envolvente ao recriar situações trágicas do Velho Mundo, a novela gráfica dá-nos um herói tridimensional, com coragem, mas com fragilidades.

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