Apresentando nos dias de hoje como uma das catapultas para o dito “cinema-ópera”, esta adaptação da partitura de Mozart é um registo algo conflituoso e ao mesmo tempo harmónico de um cineasta vergado à dimensão operática. «A Flauta Mágica» inicia com uma plateia diversificada, multiculturalmente representada, até se focar no olhar inocentado e expressivo de uma criança, a partir daí, a ótica deste espectador dilui com o olhar dos espectadores que contemplam o filme. Perante si um conto de fadas musicado, com dragões, tiranos, instrumentos de feitiços amenos e de damas, quase musas, que perfilham os destinos dos nossos heróis. Depois, existe o intervalo, “intermission” à boa maneira hollywoodesca, com os atores, elenco praticamente desconhecido das lides cinematográficas, a serem eles mesmos atores numa espera incógnita. O espectáculo recomeça, encontra-se Mozart na memória e no legado, Bergman, o cénico e a câmara, prestando atitude legítima para o feito. Com grandiosidade.
[Texto publicado originalmente na Revista Metropolis nº109, Agosto 2024]