Na mesma altura em que «Uma Viagem ao Teu Lado» chega aos cinemas, está na Filmin uma sitcom recente, «Dinosaur», coescrita e interpretada por Ashley Storrie, que explora a questão do autismo pelo lado do humor enérgico, descomplicando a visão obscura que muitas vezes se tem desse transtorno (próprio da cocriadora da série). Pois bem, antes de mais, importa saber que há ficção assim, capaz de trazer ao grande público uma imagem luminosa de uma condição socialmente pouco compreendida – o que não acontecerá, pelo menos nestes termos, no filme de Tony Goldwyn, com um ensemble de atores que garante um certo nível de simpatia, apesar de não resolver os problemas do argumento. Filmes “sobre temas sérios” é o que não falta por aí, mas pedia-se um pouco mais de ambição na abordagem, algum fator de risco e originalidade que cortasse com a pró-forma do guião para sensibilizar.

«Uma Viagem ao Teu Lado» segue a luta quotidiana de um pai e de uma mãe divorciados que lidam com um filho autista de maneiras diferentes; o típico cenário dos pais com noções opostas do que deve ser a educação dos seus filhos. Neste caso, Bobby Cannavale dá vida a um comediante de stand-up (com humor fraquinho) que ferve em pouca água no que diz respeito à proteção do miúdo, enquanto Rose Byrne interpreta a mãe de estilo executivo, uma mulher terna e prática que só quer fazer as coisas avançarem com a normalidade possível. Pelo meio, há um avô a que Robert De Niro confere uma honestidade tocante, mas nada se compara ao privilégio de ver o pequeno William A. Fitzgerald como intérprete de Ezra, um menino que tem, de facto, autismo e partilha generosamente com a câmara esse seu “modo de estar”.

Com este elemento genuíno no coração do filme, é difícil perceber o que justificou uma história tão excessiva, quando a batalha diária de alguém com autismo já constitui, por si só, uma nota forte para cultivar. Porém, Goldwyn, ou melhor, o argumentista Tony Spiridakis, optou por mais atabalhoação. A saber: «Uma Viagem ao Teu Lado» acaba por evoluir do drama para uma espécie de road movie em que o pai rapta o filho por impulso, levando a uma perseguição das autoridades… Francamente exagerado, e sem justificação de aventura no percurso, que aliás tem na banda sonora um suporte descarado. A ideia mais bonita que se alcança aqui é a do caminho necessário a fazer para se conquistar o toque físico do abraço – ninguém fica indiferente ao momento, claro, embora a falta de jeito da dita viagem continue a ser o que é.

TÍTULO ORIGINAL: Ezra REALIZAÇÃO: Tony Goldwyn ELENCO: Bobby Cannavale, William A. Fitzgerald, Robert De Niro DURAÇÃO: 101 min. ORIGEM: Estados Unidos
ANO: 2023

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