Nomeado para oito Óscares, com destaque para as categorias de Melhor Filme, Melhor Ator (Ralph Fiennes), Melhor Atriz Secundária (Isabella Rossellini) e Melhor Argumento Adaptado, o filme pode ser uma das surpresas da noite ou um dos perdedores anunciados. O seu destino na cerimónia de amanhã, 2, permanece uma incógnita, mas os contornos de drama político podem conferir-lhe um apelo especial junto da Academia, que frequentemente distingue obras com temáticas relevantes e atuais. Independentemente do desfecho, «Conclave» (2024) já se destaca como uma obra provocadora, que mistura religião e poder num retrato intenso dos bastidores do Vaticano.

O filme parte do livro de Robert Harris, publicado em 2016, que retrata as movimentações, mais ou menos claras, que têm lugar após o falecimento do Papa. Dezenas de cardeais apressam-se rumo a Roma para, em reclusão e sigilo, votarem na eleição do próximo líder da Igreja Católica, uma decisão envolta em tensão, jogos políticos e até golpes baixos. No centro da narrativa está o cardeal Lawrence (Ralph Fiennes), encarregado de supervisionar o conclave, ironicamente pouco tempo depois de uma crise de fé e de ver o Papa recusar a sua demissão. O homem, que serve como guia da audiência ao longo de toda a obra, vê-se rapidamente numa teia de intrigas, alianças inesperadas e segredos que podem alterar o rumo da eleição.
O desenvolvimento de «Conclave» (2024) é conduzido com precisão, tendo em vista o equilíbrio entre drama, suspense e intriga política. Com twists e ações imprevistas, a narrativa avança enquanto os cardeais, confinados na Capela Sistina, enfrentam pressões para eleger o novo Papa, sendo que segredos e acordos, por vezes suspeitos, podem desestabilizar o processo. O argumento combina momentos de introspeção e dilemas morais com reviravoltas estratégicas, o que faz com que o espectador seja envolvido pela história do início ao fim. A atmosfera claustrofóbica e a crescente tensão entre as personagens reforçam a complexidade do processo, transformando o conclave num verdadeiro tabuleiro de xadrez, onde cada movimento pode mudar o destino da Igreja irremediavelmente.
Ralph Fiennes entrega uma interpretação poderosa, mas, ao mesmo tempo, contida, como cardeal Lawrence, capturando com mestria a tensão interna de um homem dividido entre a fé, a lealdade à Igreja e o peso das decisões. A sua presença carismática conduz a audiência através do labirinto político e espiritual do conclave, conferindo credibilidade ao enredo e tornando também as storylines mais humanas (e falíveis). A Irmã Agnes (Isabella Rossellini) evidencia-se como uma influência silenciosa, mas marcante, enquanto o restante elenco, nomeadamente John Lithgow, Stanley Tucci e Carlos Diehz, conferem profundidade às intrigas com atuações subtis, mas bem conseguidas.
A trama aborda os dilemas morais e espirituais dos cardeais, explorando o conflito entre a religião e a ambição pessoal. As personagens enfrentam não apenas a pressão de eleger o próximo Papa, mas também os fantasmas do passado e as tentações do poder. De certa forma, a obra questiona até que ponto a devoção, apresentada como desprendida, pode coexistir com a manipulação política, trazendo para o centro a hipocrisia e a fragilidade humana mesmo dentro de uma instituição sagrada. Lawrence personifica esse conflito ao esforçar-se para manter a integridade do processo, mesmo tendo de lidar com revelações que podem abalar a Igreja. Com diálogos intensos e momentos de introspeção, «Conclave» (2024) cria um retrato complexo das suas personagens, mostrando que, por trás de tudo, há homens confrontados com dúvidas, arrependimentos e escolhas nem sempre fáceis.
O realizador Edward Berger (A Oeste Nada de Novo) constrói uma atmosfera densa e com momentos de tensão, estabelecendo uma narrativa claustrofóbica. A câmara move-se de forma calculada pelos corredores e pelos espaços fechados, captando a grandiosidade dos mesmos e reforçando a sensação de isolamento dos envolvidos. A fotografia, marcada por tons sóbrios e por uma iluminação cuidada, realça o contraste entre a solenidade da Igreja e a dureza dos confrontos. O uso estratégico de sombras e simetria sublinha a tradição e os rituais, enquanto aproximações e grandes planos das personagens evidenciam os seus conflitos interiores.
A tensão crescente e as intrigas políticas, aliadas a uma fotografia impressionante, garantem que «Conclave» (2024) seja não só um conto de ambição e corrupção, mas também uma reflexão sobre os custos do poder num contexto religioso. Ao mesmo tempo, o filme examina como o poder e a responsabilidade de liderar uma instituição religiosa tão influente podem corroer até os princípios tidos como mais sagrados. Através de personagens divididas e até com atitude questionáveis, «Conclave» (2024) coloca em destaque o dilema moral presente em cada decisão, mostrando que a procura pela verdade e pela justiça, dentro das paredes do Vaticano, é muitas vezes ofuscada pela necessidade de controlar e preservar o poder.
ÓSCARES 2025
VENCEDOR Oscar de Melhor Argumento Adaptado