A Beleza da Erva por Cortar – crítica

“A Beleza da Erva por Cortar” (Iguana) é um livro infantil escrito pelo famoso comediante Trevor Noah, que alcançou o seu estatuto graças às suas palavras honestas sobre o mundo contemporâneo aquando dos anos em que esteve no «The Daily Show». O comediante sul-africano é autor do bestseller “Born a Crime”. A sua última proposta é um livro radicalmente diferente. É uma daquelas obras que queremos ler aos nossos filhos antes de irem para a cama. “A Beleza da Erva por Cortar” é um bestseller do The New York Times, um clássico instantâneo de uma pequenina aventura que se torna audaciosa e rasga os horizontes da imaginação. A prosa de Trevor Noah não é acidental e surge num momento chave do nosso mundo polarizado pelas piores das intenções. Essas intenções podem deturpar tudo aquilo de bom que queremos ensinar às gerações vindouras em termos de compaixão e entendimento na busca de harmonia e um mundo melhor sem ódios e diferenças entre as pessoas. Os conflitos e os desentendimentos são partes necessárias da vida, porém o mais importante não é se discordamos, mas sim o modo como lidamos com essa discordância. Segundo Trevor Noah, os conflitos levam à discussão e depois à descoberta e (quase sempre) a um novo amor. Esta obra vive nas asas da imaginação, aliás, tal como as vidas deveriam ser vividas ou já foram vividas, é nesse espaço de liberdade onde tudo é possível que a aventura começa livremente, onde exploramos lugares inimagináveis. O autor relembra que a imaginação é fundamental para a resolução de conflitos quando confrontados com desafios aparentemente intransponíveis. É a nossa capacidade de imaginar possibilidades para lá do imediato e do óbvio que abre o caminho para as soluções. Este é um livro com uma grande dose de pedagogia e onde se trocam por miúdos questões que causam entropia nos adultos, mas com alguma boa-vontade e compreensão poderiam ser facilmente resolvidas. A narrativa faz isso mesmo em vários cenários de uma jornada de um menino e o seu amigo urso que decidem escapar da sua casa para o jardim e para o território das ervas altas por cortar. Nesse espaço cruzam-se com deliciosas criaturas que ensinam – através dos seus dilemas – lições de vida sobre como viver com os desentendimentos, a amizade e o respeito. O menino queria fugir de uma casa cheia de regras. Não queria camas para fazer, dentes para escovar e a cara por lavar, ele desejava aproveitar a liberdade dos sábados para não obedecer à sua mãe. O menino fugiu de casa em busca de aventuras para construir uma vida nova e ser livre de uma prisão de regras. Um gnomo de jardim explica ao menino e ao velho urso de peluche que todas as pessoas são um obstáculo a menos que tentemos compreendê-las, é como um portão que está fechado se não percebermos como é que se abre. Momentos depois, já no bosque, dois caracóis estão a meio de uma grande discussão sobre o melhor caminho a percorrer até uma maçã que caiu de uma árvore e ambos tinham razão no seu percurso. Eles já tinham percorrido muitos trajetos na sua vida, uns juntos e outros separados, mas no fim eram excelentes contadores de histórias. E com o estômago a roncar (com saudades das panquecas da mãe), os dois companheiros encontram um conjunto de moedas reunidas nas ervas a fazer cara ou coroa, se é cara ou coroa, o destino é que decide. As moedas lembram ao menino que toda a gente discute, país com os filhos e cães com os gatos, e para que as moedas decidam, elas que preferem o consenso, porque no final todos precisamos uns dos outros. Elas são moedas e precisam umas das outras para valer alguma coisa. E às vezes fazem a escolha errada e as coisas correm bem e por vezes o inverso, todas as moedas têm duas faces. A obra finaliza com a lembrança de que nem sempre se pode decidir o que vai acontecer na vida, mas podemos decidir com quem é que isso vai acontecer…

As belas ilustrações de “A Beleza da Erva por Cortar” ficaram a cargo de Sabina Hahn. A ilustradora cresceu em Riga, na Letônia, e vive atualmente em Nova Iorque. Desde tenra idade, é uma leitora voraz e desenhadora imparável, o que a levou ao mundo dos livros infantis. O seu maior talento reside em transmitir o amor discreto e a ternura tanto da vida quotidiana como dos reinos de fantasia. “A Beleza da Erva por Cortar” é um perspicaz e cativante livro infantil de Trevor Noah, está pejado de bondade e lições para a vida sobre saber conviver e respeitar as diferenças, forjando laços eternos entre pais e filhos, a história e as ilustrações são intemporais.