«The Studio», a nova aposta do streaming Apple TV+, é uma comédia satírica protagonizada por Seth Rogen, que também tem créditos de realizador em sete episódios. Esta é a história do mais recente diretor em Hollywood, e do caos que é liderar um estúdio na indústria cinematográfica.

Matt Remick (Seth Rogen), um idealista com necessidade de aprovação, torna-se, de forma mais ou menos inesperada, o diretor dos estúdios de cinema Continental. Apesar de ser um sonho, a sua missão tem tanto de ambiciosa como aparentemente impossível: revitalizar um império cinematográfico em declínio. Além das exigências impostas pelo lucro e sucesso mundial, a tarefa torna-se ainda mais complicada logo nos bastidores, devido a egos inflamados, inseguranças e decisões absurdas e verdadeiramente autodestrutivas. A mudança e a possibilidade de inovação são travadas na linha de partida por burocracia, interesses pessoais e resistência enraizada.
Com um elenco de peso – incluindo Catherine O’Hara, Kathryn Hahn e Ike Barinholtz, além das participações especiais de Bryan Cranston, Martin Scorsese e Ron Howard, entre outros –, «The Studio» transforma o drama corporativo em comédia sarcástica e afiada. Com nomes de peso a fazer de si próprios e personagens estereotipadas, a série constrói um retrato mordaz de Hollywood como um lugar onde o ego vale mais do que o talento, e onde decisões absurdas são tomadas em salas de reuniões cheias de insegurança e vaidades. É uma sátira que diverte e entretém, ao mesmo tempo que desconstrói, com tiradas de humor certeiro, os bastidores do entretenimento.
Ao ilustrar as pressões de manter um estúdio à tona, numa era em que as produções ditas tradicionais lutam para competir com os gigantes do streaming, a série aposta numa crítica mordaz e divertida ao estado atual da cultura pop. Com um olhar ácido e preciso sobre o funcionamento interno de Hollywood, «The Studio» faz rir, é certo, mas também desafia uma reflexão, ao expor com ironia as vaidades, os jogos de poder e a constante procura por relevância num sistema que parece cada vez mais perdido, às voltas sobre si mesmo.
«The Studio» não se limita a piadas fáceis sobre Hollywood ou sobre os conceitos tidos como óbvios: vai mais fundo, ao explorar como as decisões criativas são, no fundo, decisões corporativas disfarçadas. A série mostra executivos mais preocupados com métricas, imagem pública e hype do que com a qualidade artística do que estão a desenvolver. A crítica ganha força ao expor a hipocrisia da indústria, que se vende como progressista e criativa, mas é movida por egos, dinheiro e medo do fracasso. Esta trama não poupa ninguém: desde realizadores tidos como visionários até atores narcisistas e responsáveis de marketing desesperados por conteúdos virais. Há uma exposição da superficialidade por detrás do glamour e um desconforto constante entre a arte, ou as suas ambições disruptivas, e o negócio.
A série da Apple TV+ aborda de forma assertiva, mesmo que recorrendo ao humor, a crise de identidade que a indústria enfrenta na era do streaming. Os personagens vivem obcecados com a ideia de relevância. Não falamos da relevância artística… mas digital: número de cliques, trends e hashtags. «The Studio» foca a suposta pressão constante pela inovação, que termina sempre em ciclos viciosos e “mais do mesmo”, a dificuldade de competir com algoritmos e a ansiedade coletiva motivada pelas redes sociais. Não podia faltar o “cancelamento”, nomeadamente os posicionamentos fúteis, captando o espírito do tempo de forma certeira, com um tom cínico e atual.
Com uma realização inteligente, um argumento bem ritmado e um elenco forte, «The Studio» é mais do que uma simples comédia sobre bastidores: é um espelho distorcido (mas ironicamente preciso) de uma indústria em permanente estado de crise de imagem. Com personagens caricaturais, mas plausíveis, a série destrói as ilusões do entretenimento moderno e questiona até que ponto a cultura pop ainda é conduzida por criatividade, ou apenas por estratégias de sobrevivência num mercado saturado.
Se Hollywood tivesse coragem de se ver ao espelho, possivelmente veria algo muito parecido com «The Studio»; e, provavelmente, não ia gostar do que via. É que a série da Apple TV+ prova que a sátira ainda é uma das formas mais eficazes de dizer a verdade…