Embora com uma carreira que já se desenvolve há mais de uma década, o iraniano Asghar Farhadi só começou a ser realmente conhecido do público europeu a partir de «Uma Separação» (2011). E tanto mais quanto o filme conseguiu um invulgar impacto internacional, acumulando diversos prémios de grande prestígio, incluindo o Urso de Ouro do Festival de Berlim e o Oscar de melhor filme estrangeiro. Poderia, talvez, supor-se que a sua metódica observação das relações humanas e, em particular, das tensões do espaço conjugal seriam indissociáveis das componentes da sociedade iraniana. O certo é que, para além dos seus muitos méritos artísticos, «O Passado» mostra que Farhadi é capaz de alargar o leque temático da sua obra, conseguindo mesmo relançar o registo (melo)dramático num contexto em que o choque de culturas é essencial. Esta é, afinal, a crónica íntima de um confronto que oscila entre França e Irão. Ou seja: um iraniano chega a terras francesas para finalizar o seu divórcio, mas o facto de a sua mulher estar a viver com um francês de origem árabe baralha todos os dados, abrindo uma crise que vai afectar pelo menos três gerações… O menos que se pode dizer do elaborado e subtil cinema de Farhadi é que a sua dependência do trabalho dos actores, sempre impecavelmente dirigidos, lhe confere uma dimensão genuinamente universal: Ali Mosaffa, Tahar Rahim («O Profeta») e Bérénice Bejo («O Artista») são brilhantes, ilustrando a energia de uma visão cinematográfica em tudo e por tudo alheia a qualquer snobismo tecnológico.
Título original: Le Passé Realização: Asghar Farhadi Elenco: Bérénice Bejo, Tahar Rahim, Ali Mosaffa Duração: 130 min França/Irão, 2013
[Texto originalmente publicado na revista Metropolis nº15, Dezembro 2013]
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