Entre 22 a 25 de outubro, Baião voltou a ser o lugar onde a juventude, a imaginação e o cinema marcaram encontro. O JUVE — Encontros do Cinema e da Literatura Infantojuvenil — regressou este ano com uma energia especial, reafirmando-se como muito mais do que um festival: é um território de escuta, de partilha e de descoberta. Durante quatro dias, o cinema, a música e a palavra ganharam palco no Auditório Municipal, na Biblioteca Municipal e algumas escolas do concelho.
Com curadoria de Rui Pedro Tendinha, a edição deste ano trouxe para o centro uma homenagem luminosa a Carmen Chaplin, neta de Charlie Chaplin, símbolo de uma herança artística que resiste ao tempo e que continua a inspirar gerações. Mais do que celebrar um nome, a presença de Carmen Chaplin em Baião tornou-se um momento de partilha rara, num diálogo sobre o legado do avô e o papel da arte na construção da sensibilidade. Uma conversa que antecedeu a exibição, em cópia restaurada e musicada pelo próprio Chaplin – que não sabia escrever pautas –, de «A Quimera do Ouro», filme que emocionou a plateia e que, quase um século depois, ainda provoca o riso e o espanto, mesmo junto dos mais jovens.
Na mesma sessão, Joana Pais de Brito acentuou o espírito extraordinário dos filmes de Charlie Chaplin: “Fazem-nos rir, mas são também muito comoventes. É como ler um poema”. Já Guilherme Blanc, director artístico do Batalha Centro de Cinema (Porto), relembrou o lado social do trabalho do cineasta. “É um mestre da comédia, mas fez algo muito importante que influenciou a sétima arte: é um cinema social. Pensa no mundo que o rodeia, é muito sensível aos desprotegidos da sociedade, o que é muito difícil de fazer. Trata assuntos sérios, com humor e por isso era um cineasta com muita coragem”, acrescentou.

O cinema como aglutinador
Ao longo dos dias, o JUVE foi abrindo portas a uma programação generosa. Houve antestreias nacionais — como «O Velho e a Espada», de Fábio Powers, e «É do Inimigo?», de Alexis Morante —, mas também sessões dedicadas à identidade local, com curtas-metragens rodadas no concelho, como «O Menino de Baião» (de João Seugirdor), «Meia Dúzia de Hábitos» (de Salvador Gil), «O voo do Monteiro» (de Paulo Ferreira)e «Chama» (de Lucas Dutra). Baião não foi apenas cenário destas quatro curtas: foi personagem, espaço de criação e ponto de partida para novas histórias.
O festival afirmou-se igualmente como um espaço de aprendizagem. As escolas locais estiveram presentes em força, participando em masterclasses com a atriz Paula Magalhães e em oficinas de “cinema com telemóvel”, orientadas por Luísa Sequeira e Sama, além da mentoria e partilha da madrinha do festival, Sónia Balacó. Com o realizador Nuno Rocha, e o apoio e participação de uma das escolas, a curta «O Protótipo» gerou risos nervosos de quem se está a ver num filme pela primeira vez, emoções fortes e o orgulho de ver Baião e os seus residentes fazerem parte de um filme que, quem sabe, pode ter descoberto novos atores de cinema.
O encerramento do evento chegou com o cine-concerto de Benjamim, que deu nova vida a filmes mudos icónicos – «A Viagem à Lua», de Georges Méliès, (1902) e «A Vingança do Cameraman» (1912), de Wladysław Starewicz – através da música. A melodia fundiu-se com as imagens antigas e, por momentos, o tempo pareceu suspender-se.

Os jovens no centro de tudo
Tudo isto aconteceu num festival gratuito aberto a todos, onde não se pedia mais do que curiosidade e presença. O JUVE voltou a provar que não são os grandes palcos que fazem a grandeza de um evento, mas a intensidade do que nele se vive. Em Baião, entre livros, filmes, encontros improváveis, uma equipa imbatível e o apoio ativo da Câmara Municipal, cultivou-se o essencial: a ideia de que a cultura pode ser uma casa para todos — e que a juventude, quando ouvida, é capaz de reinventar o mundo com as suas próprias mãos. Como resumiu a atriz Paula Magalhães, a experiência no Juve não se vê, sente-se: «Ter ido ao festival Juve foi um acumular de momentos bons. Voltei mais “rica” e mais feliz. Acho que este tipo de iniciativas têm de persistir, porque acredito que cultura grita por mais cultura e quanto mais alto grita, mais se ouve. Num momento onde tudo parece frágil e incerto, é ainda mais urgente este grito”.


