Quando a cópia restaurada da comédia «A Quimera do Ouro» (“Gold Rush”) estiver a arrebatar novos fãs em Cannes, à luz de Charles Chaplin (1889-1977), a diva francesa Juliette Binoche vai desfilar pelo Palais des Festivals, na Croisette, para anunciar as bases do seu trabalho como presidente do júri deste ano. A atriz de «O Paciente Inglês» (que lhe rendeu o Óscar em 1997) vai coordenar uma equipa que reúne a estrela americana Halle Berry; a atriz italiana Alba Rohrwacher; a indiana Payal Kapadia, que ganhou o Grand Pix cannoise de 2024 pela realização de «All We Imagine as Light: Tudo o Que Imaginamos Como Luz»; a argumentista franco-marroquina Leïla Slimani; o documentarista e produtor congolês Dieudo Hamadi; o multiartista sul-coreano Hong Sangsoo, hoje definido como o realizador mais prolífico da atualidade; o cineasta e produtor mexicano Carlos Reygadas; e o aclamado ator da série “Succession”, Jeremy Strong, dos EUA. O trabalho deles vai de 13 a 24 de maio. Tudo começa após a sessão de «Partir un Jour», da estreante Amélie Bonnin, que abre a programação cannoise.
“Qualquer gesto de humanismo hoje é um gesto político. Se a nossa decisão por política, será pelas vias da humanidade”, disse Juliette à METROPOLIS ao presidir juradas e jurados da Berlinale em 2019, quando concedeu o Urso de Ouro a Israel, ao premiar «Sinônimos», de Nadav Lapid.
Há pouco, ela brilhou nas telas de Lisboa ao lado de Ralph Fiennes em «The Return», de Uberto Pasolini. Não terá títulos lusitanos na competição oficial, mas vai analisar um concorrente em português egresso do Brasil: «O Agente Secreto», de Kleber Mendonça Filho.
“Eu continuo investinda no cinema para descobrir o que não sei, para me deixar ser surpreendida”, disse Juliette à METROPOLIS em entrevista no Festival de San Sebastián, quando brilhou nas telas da Europa com «O Sabor da Vida» [foto], de Tran Anh Hug.

Em 2024, ela foi escalada para um outro posto de comando: presidir a Academia Europeia de Cinema. Essa entidade cuida da preservação estética e política da produção do Velho Mundo.
“A covid-19 ampliou a minha inquietação com a ecologia. Tenho pensado muito na preservação de ecossistemas, inclusive o da memória, desde a pandemia. Acho que uma das coisas que mais me doeram no boom do coronavírus na Europa foi não poder estar livre para andar até o mar, caminhar numa praia. Isso é uma restrição que te cerceia da natureza e afeta de forma negativa a minha entrega aos filmes. É necessário se cuidar melhor deste planeta”, disse Binoche.
Em cartaz na Apple TV com «The New Look», Binoche não diminuiu o seu ritmo de produção nas telas, mas tem muito trabalho nos seus afazeres na Academia Europeia. A tarefa honorária do cargo que ela passa a ocupar tem um forte poder simbólico e personifica o projeto europeu de alimentar uma postura industrial autoral autossustentável. Ingmar Bergman foi o primeiro presidente da instituição, tendo sido escolhido pelos 40 membros fundadores da Academia em 1989. Wim Wenders sucedeu-lhe em 1996 e exerceu o cargo até 2020, tendo sido seguido por Agnieszka Holland.

“Fico comovida quando as pessoas se contagiam com o meu modo de trabalhar”, disse Binoche, que extraiu elogios dos festivais Toronto e Roterdão com «The Return» [foto], com o título de «O Regresso de Ulisses» em Portugal.
A trama filmada por Uberto Pasolini é inspirada nas reflexões de Homero. No argumento, Odisseu (papel de Fiennes) decide voltar a seu lar depois de duas décadas de ausência. No seu regresso, muita coisa mudou no seu reino, sob o impacto da Guerra de Troia. Penélope (Binoche) será a sua principal aliada.
Há novos filmes com Binoche para estrearem até dezembro. O seu próximo projeto será «Camino Real», no qual vai atuar sob a direção de Ethan Hawke, o seu parceiro em «A Verdade», de Hirokazu Koreeda, que abriu o Festival de Veneza de 2019.

