«Adultos» apresenta-se como a antítese cínica de «Friends». Se naquela Nova Iorque ensolarada dos anos 90 a vida adulta parecia uma sucessão de cafés animados e dilemas amorosos ligeiros, aqui o cenário é outro: claustrofóbico, desorganizado e sem encanto.

Quando vemos um grupo de amigos dividir casa e experiências, é inevitável pensar em «Friends», «Foi Assim que Aconteceu» ou «A Teoria do Big Bang». Durante várias temporadas, estas séries abordaram um conceito de convivência jovem – divertida, caótica, mas, no fundo, sempre reconfortante. No entanto, «Adultos» não só rejeita essa conceção como parece querer desmontá-la. Se «Friends» era um ideal confortável de amizade e estabilidade emocional disfarçada de confusão, «Adultos» é um retrato mais honesto da precariedade emocional e financeira que define a vida de muitos jovens adultos.

Esta nova série do FX, disponível no streaming Disney+, recusa o conforto da nostalgia e opta por uma visão mais crua do que significa partilhar casa, contas e frustrações numa fase da vida em que já se devia ter tudo resolvido, mas não está (nem perto). A estética visual é mais contida, quase claustrofóbica, como que a reforçar o sentimento de estagnação que paira sobre as personagens. A casa que partilham, longe de ser um espaço acolhedor, é uma espécie de cápsula emocional, onde o passado infantil se cruza com um presente sem rumo.

No centro está um quinteto disfuncional, composto por Samir (Malik Elassal), Billie (Lucy Freyer), Paul (Jack Innanen), Issa (Amita Rao) e Anton (Owen Thiele). Samir, por exemplo, é o anfitrião relutante da casa onde todos vivem, que oscila entre a necessidade de agradar e a incapacidade de tomar decisões. O que torna estas personagens interessantes não é o seu carisma, mas a sua desconcertante verosimilhança. Estão apenas a resistir ao colapso, cada um à sua maneira. São personagens que parecem viver sem guião, à deriva, e é precisamente essa falta de direção que as aproxima de quem vê.

As personagens permanecem praticamente no mesmo lugar emocional e existencial onde as encontramos no primeiro episódio, como se qualquer possibilidade de mudança estivesse fora de alcance ou, pior ainda, fora de propósito. A série não se interessa em construir arcos de superação nem em guiar o espectador por um caminho de transformação gradual. Pelo contrário, opta por fixar-se no impasse: um estado de suspensão, de tentativa interrompida, onde cada pequeno gesto parece insuficiente para gerar verdadeiro movimento.

«Adultos» não pretende oferecer uma catarse fácil ao espectador. Em vez de se apoiar em arcos de redenção ou num crescimento linear das personagens, a série opta por retratar o impasse; esse estado de suspensão onde muitos jovens adultos se encontram. Assim, não há evolução evidente nem moralidade disfarçada: há apenas uma sucessão de dias iguais, de escolhas adiadas e de tentativas frustradas de autonomia emocional e financeira. O que «Adultos» nos oferece é um espelho imperfeito, mas brutalmente honesto, de uma geração que vive a gerir danos e expectativas, enquanto tropeça na inércia.

«Adultos» não procura agradar nem convencer, apenas se limita a mostrar. E é precisamente nessa recusa de agradar que encontra a sua identidade. É uma série sobre o vazio, a hesitação e a sobrevivência emocional num tempo em que tudo parece transitório, inconsequente. Pode não oferecer momentos memoráveis ou frases icónicas, mas oferece algo mais raro: autenticidade. E, num panorama televisivo cada vez mais moldado ao algoritmo e à previsibilidade, isso já é, por si só, subversivo.

ARTIGOS RELACIONADOS
Call My Agent Berlin: agentes no fio da navalha

Agentes em modo bombeiro: a cada cliente salvo, um novo incêndio começa. «Call My Agent Berlin», no Disney+, prefere humor Ler +

Coração de Ferro – trailer

“Coração de Ferro”, da Marvel Television, com lançamento exclusivo no Disney+ a 25 de junho, é a nova e intrigante Ler +

A VERDADEIRA DOR

[Estreia na Disney+] A partir das reflexões trazidas pela leitura de João Maria Mendes e seu “Culturas Narrativas Dominantes”, o Ler +

Demolidor: Born Again

Olha quem é ele! O Demolidor está de volta ao streaming, desta feita com um reboot na Disney+. Charlie Cox Ler +

Paradise

Um Paradise que de paraíso pouco ou nada tem. Dan Fogelman e Sterling K. Brown voltam a trabalhar juntos, depois Ler +

Please enable JavaScript in your browser to complete this form.

Vais receber informação sobre
futuros passatempos.