Pessoas fantasiadas de Totoro, o mais famoso personagem do estúdio de animação japonês Ghibli, amanheceram durante o primeiro fim de semana do Festival de San Sebastián de 2023 (realizado de 22 a 30 de setembro) e faziam uma fila imensa, debaixo de uma incessante chuva, para conferirem a passagem do arrebatador «O Rapaz e a Garça», de Hayao Miyazaki. Era uma prova do culto em torno de um criador com 51 anos de experiência na realização.
«O Rapaz e a Garça» é um exuberante exercício gráfico do vencedor do Oscar (e do Urso de Ouro de 2002) por «A Viagem de Chihiro». Aos 82 anos, distante das longas há cerca de uma década, Miyazaki regressa com o que promete ser o seu maior filme em termos comerciais e uma promessa para a estatueta da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que o adora. É uma trama melancólica sobre a aceitação da finitude e a superação do luto, mas narrada com uma direção de arte muito colorida. O seu protagonista, o menino Mahito, muda-se para o interior do Japão, no fim dos anos 1930, após a perda da sua mãe, lá é assombrado por uma garça falante que o arrasta para uma espécie de limbo. Pelicanos selvagens e uma horda de periquitos atacam o rapaz, que precisa aprender a permitir que o amem-no para amadurecer. É uma narrativa sublime sobre a educação pela perda, na qual o antropomorfismo – marca habitual do fantástico na animação do cineasta – alcança um rigor plástico pleno na direção de arte. São criaturas sombrias, a começar da garça do título, espécie de signo dos males que nos aterram na melancolia.
Título original: Kimitachi wa dô ikiru ka Título internacional: The Boy and the Heron Realização: Hayao Miyazaki Elenco (Vozes): Duração: 124 min. Japão, 2023
[Texto publicado originalmente na Revista Metropolis nº100, Dezembro 2023]
- NOMEAÇÃO PARA OSCAR DE MELHOR FILME DE ANIMAÇÃO
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