[Texto originalmente publicado na Revista Metropolis nº35, Fevereiro 2016]
Na lista de candidatos aos Oscars, encontramos «Carol» com uma magnífica performance: nada mais nada menos que seis nomeações, incluindo duas no sector de interpretação, para Cate Blanchett e Rooney Mara, respectivamente para melhor actriz e melhor actriz secundária.
Se a temporada dos prémios vai gerando alguma frágil lógica de “vencedores” e “vencidos”, podemos até supor que «Carol» não surgirá na linha da frente da cerimónia do dia 28 de Fevereiro (mesmo Blanchett, até certa altura tida como favorita, poderá ceder a honra à também brilhante Brie Larson, em «Room»). Seja como for, seria importante que um filme como este não ficasse prisioneiro de qualquer simplismo mediático. De facto, com ou sem prémios, Todd Haynes conseguiu a proeza de revitalizar o mais clássico modelo melodramático, por assim dizer, expondo o seu avesso moral.
Não é uma surpresa, claro. Afinal de contas, em 2002, com Julianne Moore no papel central, Haynes assinara o belíssimo «Longe do Paraíso», assumindo-se como herdeiro directo de uma tradição que tem em Douglas Sirk (1897-1987) uma referência primordial. «Carol», adaptando o primeiro romance de Patricia Highsmith (1921-1995), centrado na paixão de duas mulheres, em 1952, recupera um vector fundamental dessa tradição. A saber: a ocultação social dos movimentos amorosos exprime-se através das singularidades do desejo e da irredutibilidade dos corpos — a contradição que assim se exprime está no cerne de qualquer escrita melodramática.
Há, por isso, em «Carol», um desafio, simultaneamente estético e comercial, simbólico e industrial, cuja pertinência se tem reforçado nos últimos anos. Trata-se de saber se, num espaço de produção e difusão em que os “blockbusters” ainda impõem as suas leis, continua (ou não) a haver lugar para um cinema que não abdica da intimidade das personagens e, nessa medida, se enraíza na verdade específica do trabalho dos actores… Enfim, simplificando, para além da excelência narrativa de Haynes, digamos que Blanchett e Mara nos garantem que tal cinema, com a sua contagiante intensidade humana, não desapareceu.
Título original: Carol Realização: Todd Haynes Elenco: Cate Blanchett, Rooney Mara, Sarah Paulson, Kyle Chandler Duração: 106 min. Reino Unido/EUA/Austrália, 2015
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