Em “O Lobo” (Edição Arte de Autor), o pintor, ilustrador e criador de banda desenhada Jean-Marc Rochette criou um duelo intemporal entre o homem e a natureza. No face a face de dois grandes predadores, nasce um extraordinário álbum de luxo de banda desenhada, que combina a contemplação, a beleza e os rigores da paisagem, mas também diz muito sobre as dinâmicas existenciais do nosso mundo (Natural e Humano).
A história desenrola-se nos Alpes Ocidentais, mais precisamente no interior do Maciço dos Écrins, em território francês. Gaspard é um pastor que viveu sempre nas montanhas, está só após perder o filho, militar no Mali, e vai ver a sua mulher padecer de desgosto. É uma pessoa recalcada pela rugosidade da vida e as invasões das suas fronteiras, as reais e as ficcionais. Ele é o senhor do seu reduto. No isolamento da montanha, a sua única companhia é o cão Max e o seu rebanho no tempo da pastagem. Em pleno Parque Natural, e após perder várias ovelhas, Gaspard (que também é um exímio caçador) mata uma loba que lhe dizimava o rebanho. A cria assiste à morte da mãe e nasce uma titânica história de vingança. Um lobo (predador) que cresce com o ajuste de contas em mente face ao assassino da mãe. Os dois machos alfa, o lobo e o pastor, ressabiados pela vida, encetam um perigoso jogo mortal na Alta Montanha. É um twist inesperado onde um incidente passado vai tornando proporções dantescas, originando um thriller de sobrevivência.
Nessa arrepiante trajectória, a luta entre homem e animal oferece-nos na realidade uma alegoria para a existência humana, dada ao confronto pelas mais simples minudências. Através desta colisão entre homem e lobo também descobrimos a possibilidade de coexistência e o entendimento da vida quando temos a capacidade de ver o problema do lado inverso.
Rochette aborda igualmente uma contenda milenar (homem e lobos) que nas últimas décadas se transformou no confronto dos pastores com os parques naturais e os conservacionistas que tentam preservar espécies em vias de extinção. Apesar de ser rabugento, o pastor Gaspard entende perfeitamente a vida e a dinâmica do mundo natural.
É uma história que realça a beleza natural que ainda não foi corrompida pelo homem, um cenário onde este se torna a presa perante o impiedoso mundo natural. O magnífico desfecho desta obra ficará para sempre na nossa memória, a união de dois predadores de espécies diferentes que se juntam para sobreviver num compromisso com a vida.
“O Lobo” traz-nos uma avalanche de emoções, uma fábula moderna carregada de poesia e cheia de beleza.