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R A I N ER W ER N ER F A S S B I N D
LEGADO MISSÃO IMPOSSÍVELER
MAMÃ KUSTERS VAI PARA O CÉU [1975]
Este «Mutter Kusters Fahrt Zum Himmel» («Mamã existencial, mas ambas acabam por viver em quadros
Kusters Vai Para o Céu»), 1975, Rainer Werner ficcionais que, sendo próximos, na sua componente
Fassbinder, assume de forma quase absoluta os material resultam distantes: porque, em meados
valores alemães, a cor alemã, as personagens alemãs, dos anos setenta, Fassbinder preferiu interiorizar o
o drama e o melodrama alemães, a política e a combate de uma mulher pela verdade no pós-guerra,
subversão alemãs, o milagre e o pesadelo alemães, vinte anos depois da derrota nazi, obrigada que foi a
no quadro de uma carreira onde o realizador equacionar as razões que levavam, numa democrática
demonstrou ser capaz de interpretar a sua identidade República Federal Alemã, beneficiária da reconstrução
nacional sem no entanto perder o norte e a inegável e das contradições do Plano Marshall, a ser projectado
capacidade de reflectir sobre a sociedade em geral. Na nas primeiras páginas da imprensa sensacionalista
verdade, ecos de um antigo filme alemão, intitulado um acto isolado de violência descontrolada numa
«Mutter Krausens Fhart Ins Gluck» («A Viagem da fábrica de produtos químicos, o assassinato por parte
Mãe Krausen Para a Felicidade»), 1929, de Phil Jutzi, de um operário de um funcionário superior ligado
pairam sobre «Mamã Kusters Vai Para o Céu». Mas ao patronato. Esse operário, que depois de matar o
ao contrário do clássico influenciado pelas soluções Director de Pessoal se suicidou, não era outro senão o
políticas defendidas por Bertolt Brecht, a mãe marido da senhora Kusters (interpretada por Brigitte
Krausen e a mãe Kusters são dois seres isolados do Mira), pai de dois filhos, a saber, um rapaz simpático
mundo, sozinhas face ao seu destino e ao desespero mas amorfo (Armin Meier), casado com uma arrivista
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