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ideia de que, no século XI, não es-
tavam apenas em jogo coroas, mas
também legados familiares.
«King & Conqueror» não esconde a
sua ambição de se inscrever como
crónica visual da época. A série re-
cria o ambiente político e cultural
com atenção ao detalhe, desde a
liturgia da corte anglo-saxónica
até à organização militar norman-
da, e procura equilibrar rigor com
dramatização. O ritmo assume-se
pausado, quase solene, privile-
giando a construção das relações
de poder e das tensões familiares
em detrimento da ação constante.
Essa opção dá densidade ao enredo
e permite que cada gesto seja lido
como prenúncio de conflito. As re-
ferências históricas, ainda que por
vezes moldadas à conveniência do
DOIS HOMENS, UMA COROA E O PESO DA HISTÓRIA guião, mantêm-se reconhecíveis e
HBO MAX oferecem à audiência uma leitura
acessível de um dos capítulos mais
decisivos da história europeia.
Grande parte da força de «King & Conqueror» se apoie sobretudo em
Conqueror» reside no trabalho dos Harold e William, o elenco secun- No fim, «King & Conqueror» im-
seus protagonistas. James Norton dário contribui de forma decisiva põe-se menos como uma lição de
dá a Harold uma dimensão contra- para a densidade dramática. Edi- História e mais como um exercí-
ditória: entre a coragem do guer- th (Emily Beecham) surge como cio sobre a fragilidade do poder
reiro e a hesitação do homem di- contraponto emocional, oferecen- e a inevitabilidade do destino. A
vidido por lealdade familiar e pela do a Harold uma componente de sua força reside na forma como
necessidade de afirmar autorida- intimidade que contrasta com a transforma figuras lendárias em
de. Já Nikolaj Coster-Waldau com- carga da responsabilidade. Matil- homens de carne e osso, presos a
põe um William frio, estratégico, da (Clémence Poésy), por sua vez, escolhas que ressoam ainda hoje.
mas nunca desprovido de huma- dá corpo a uma figura feminina de Pode não agradar a quem procura
nidade, revelando um duque que rara firmeza no seu tempo, capaz apenas o espetáculo das batalhas,
oscila entre a ambição política e a de influenciar William sem nunca mas recompensa o público dispos-
vulnerabilidade perante os seus. É perder a sua própria voz, e Lady to a mergulhar na tensão íntima
na colisão destas duas presenças Emma (Juliet Stevenson) acres- que antecede os grandes aconteci-
que a série encontra a sua maior centa uma dimensão política as- mentos. Ao revisitar 1066, a série
tensão dramática, sustentando tuta às intrigas de corte. Junta-se lembra-nos que a História não é
cada episódio com o anúncio la- Gytha (Clare Holman), matriarca feita apenas de vitórias e derrotas,
tente de um combate inevitável. determinada e estratega silencio- mas também das contradições e
sa, cuja presença confere à trama dilemas que moldam quem a vi-
Embora a narrativa de «King & um peso geracional que reforça a veu.
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