«Royal Hotel» é um intenso filme independente realizado pela australiana Kitty Green. No elenco salta à vista o nome de Julia Garner, a actriz que ficou nas bocas do mundo a partir de «Ozarks». Ela não perdeu o seu magnetismo e ninguém consegue evitá-lo. A actriz é uma força da natureza pelo seu poderoso trabalho no equilíbrio entre a contenção e a explosão sentimental expressado no papel de Hanna. A sua personagem é uma jovem canadiana que vai de férias para a Austrália com a sua amiga Liv (Jessica Henwick). Em Melbourne, as duas amigas ficam sem dinheiro e decidem embarcar num programa de trabalho durante as férias. Elas só encontram um trabalho num bar remoto e decadente no meio do deserto australiano. O estabelecimento é frequentado maioritariamente pelos mineiros da região.
A Austrália, durante décadas, foi fértil em tratados sobre o medo em torno do isolamento do deserto e do interior profundo deste continente, dando origem a todo tipo de medos como «Mad Max – As Motos da Morte» (1979), «Um Grito de Coragem» (1988) e «Wolf Creek» (2005). E «Royal Hotel» não é excepção, o terror está bem presente do primeiro ao último minuto desta obra. O problema, para alguns, é que o medo ou o terror para ser real tem de uma parafernália de tiques, adereços e rios de sangue. A incapacidade de nos colocarmos no papel de duas jovens atraentes rodeadas de masculinidade tóxica é o impedimento para nos apercebermos do medo e da psicologia de terror debaixo da pele que é extremamente bem exposto nesta obra por Kitty Green. O filme apresenta o lado neanderthal dos mineiros que frequentam um bar desolado onde consideram a objectificação da mulher como algo normal. Os acontecimentos estão em crescendo onde mesmo a inocência de alguns revelam motivos mais sinistros. Hanna no seu cepticismo cria uma barreira contra o risco – uma espécie de sexto sentido – que a vai proteger a si à sua amiga (que prefere estar embriagada e à mercê dos predadores). A faceta de cepticismo de Hanna é tratada com hostilidade e não lhe faz favores em termos de popularidade mas torna-se um dispositivo de preservação. «Royal Hotel» é uma história simples mas inteligente na análise comportamental sobre a masculinidade tóxica e o seu lado ainda mais sinistro. A obra conta com uma bela interpretação de Julia Garner e um apontamento curioso de Hugo Weaving como o dono do bar que há muito perdeu as estribeiras.
Título original: The Royal Hotel Realização: Kitty Green Elenco: Julia Garner, Jessica Henwick, Ursula Yovich, Hugo Weaving Duração: 91 min. Austrália/Reino Unido/EUA, 2023