Jane Grey teve uma morte trágica, depois de ter ocupado um trono que nunca ambicionou. Na nova série da Amazon Prime, a história desta “dama em apuros” é alterada com sucesso…

O narrador de «My Lady Jane» diz logo ao que vem: Jane Grey (na série interpretada Emily Bader) foi injustiçada no passado e vai puder fintar a sua própria história. Na realidade, a jovem foi incluída num casamento por interesse e acabou no trono na sequência da morte de Eduardo VI, filho de Henrique VIII, depois de ter sido nomeado como herdeira. No entanto, uma jogada rápida de Maria, irmã de Eduardo, levou a que fosse acusada de traição e morta poucos dias depois.

Bebendo inspiração do que se sabe acerca da protagonista, «My Lady Jane» retrata uma jovem segura de si, inteligente e revoltada com as regras estabelecidas na sociedade, que retira qualquer sensação de liberdade às mulheres. No entanto, a sua rebeldia é testada quando a mãe Frances (Anna Chancellor) e um tutor acordam o seu casamento com um dos filhos de Lord Dudley (Rob Brydon), conselheiro do rei. Sem filhos homens, Frances usa o estatuto que ainda têm na hierarquia social para tentar mudar a sua sorte, enquanto Dudley tem os olhos na coroa, uma vez que o rei Eduardo (Jordan Peters) se encontra às portas da morte.

Se, tal como nos conta a história, o confronto entre protestantes e católicos esteve no centro do conflito, desta vez há uma forte componente de fantasia. A população está dividida entre os “Verity” (verdadeiros) e os “Ethians” (etianos), pessoas que têm a capacidade de se transformar em animais, e que são perseguidos pela guarda do rei. O clima de guerra civil vai servindo de motor à narrativa, que parte da História para criar uma intrincada história de ficção.

Duas das personagens mais caricatas, e também mais influenciadoras, são Mary (Kate O’Flynn) e Lord Seymour (Dominic Cooper). A dupla cria uma segunda linha narrativa que embala ainda mais os acontecimentos, à medida que vão sendo incluídas mais personagens e mistérios. Já Elizabeth (Abbie Hern) e Susannah (Máiréad Tyers) funcionam de forma mais transversal e, a espaços, atuam como bússola moral dos demais intervenientes.

A série tem várias semelhanças com «Bridgerton», seja pelas restritas regras sociais, seja pela storyline de “inimigos para apaixonados” entre Jane e Guilford (Edward Bluemel), ou até por algumas escolhas em termos de casting (criando uma quebra com os estereótipos da época/figuras históricas). A principal diferença reside na estrutura do argumento, mais concentrado, e na tal vertente de fantasia que muda totalmente as regras do jogo. Há preconceito, divisão e uma perseguição intensa, com consequências terríveis para os culpados.

Esta é uma criação da estreante Gemma Burgess, que se baseia no livro com o mesmo nome de Cynthia Hand, Brodi Ashton e Jodi Meadows. A trama reinventa a história, trazendo alguma justiça através da ficção. No entanto, e como nada é fácil, este é só o início da batalha.

[Texto publicado originalmente na Revista Metropolis nº108, Julho 2024]

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