«Um Lugar Silencioso 2» é um thriller arrepiante e ao qual é difícil de virar as costas. Pode-se dizer que ficamos colados ao ecrã do primeiro ao último minuto. Relembramos que o conceito original de Scott Beck e Bryan Woods, com o auxílio de John Krasinski, lidava com uma invasão da Terra por uma implacável espécie alienígena que perceciona o espaço através da audição e que empala tudo o que se mexe dizimando a vida no planeta. No centro da história está uma família que tem de se reinventar para sobreviver.
Em «Um Lugar Silencioso 2» o vertiginoso prólogo é um excelente cartão de visita para os acontecimentos que se seguem, não ficamos pendurados se não tivermos visto o primeiro capítulo, e o filme não desilude em nenhum instante. O paradigma muda na sequela, saímos do isolamento da quinta e da luta pela sobrevivência da família Abbott, da dinâmica dos pais na sua relação e na proteção dos filhos. Neste filme é o lugar dos filhos procurarem a esperança e criarem um lugar sem monstros. É evidente que para nós que sobrevivemos a um ano que marcará o resto das nossas vidas, «Um Lugar Silencioso 2» partilha alguns lugares-comuns, seja na disrupção da sociedade, o enfrentar uma nova realidade, o isolamento, a angústia, mas também a necessidade de lutar e derrotar todas as adversidades.
Os protagonistas deste filme iniciam uma catarse conjunta onde encetam diferentes viagens que culminam numa grandiosa apoteose onde os laços se reforçam e todos lutam contra um inimigo comum. Os personagens mais adultos, Evelyn Abbott (Emily Blunt) e Emmett (Cillian Murphy) devem ultrapassar os seus próprios medos e fazerem a diferença. Nesta premissa, mesmo com um elenco pequeno mas de qualidade superlativa, os fios narrativos destrinçam-se perante o olhar atento dos espectadores. O intimismo da família dá lugar à panorâmica do espaço e do mundo pós-apocalíptico onde o terror está à distância do mínimo ruído. A dupla de jovens actores enchem a vista, Noah Jupe e Millicent Simmonds (melhor desempenho do filme) levam mais além os seus papéis. Estes tinham mesmo de ser bem destilados para nos fazer acreditar e seguir a jornada alucinante destes personagens que pela sua condição única (são surdos) observam o mundo de uma forma singular – lembramos que Millicent Simmonds é surda na vida real. Emily Blunt tem um desempenho pleno de estoicismo, alguém que irá até ao inferno para salvar os seus filhos. Para a matriarca do clã Abbott não é um momento de luto, apenas de sobrevivência. A actriz mostra urgência no seu desempenho mas é ofuscada pelas performances de Millicent Simmonds e Cillian Murphy. O actor britânico que é como o algodão, não engana, veste totalmente o corpo e o cepticismo do seu personagem que terá de lutar com os seus temores para vencer a apatia e agir. É muito mais do que um desempenho físico, a intensidade está espelhada no seu rosto.
A finalizar, mérito para o desempenho na cadeira de realizador e argumentista de John Krasinski, um director de actores e de planos extremamente bem filmados em película de 35mm. John Krasinski é cada vez mais uma certeza atrás da câmara, seja pela sensibilidade com os actores, seja com um olhar clínico e mesmo na supervisão dos vários departamentos de arte, na criação de uma obra imersiva. No capítulo técnico, os monstros também estão mais assustadores e com vários detalhes de FX da Industrial Light and Magic que permitem ver o terror em todo o seu esplendor.
A Paramount apostou na paixão de John Krasinski e venceu, voltou a tomar a decisão acertada, «Um Lugar Silencioso 2» faz-nos voar baixinho numa imparável montanha russa emocional. É uma obra sensorial que tem outro sentimento no interior de uma sala de cinema. Bem-vindos ao factor medo!
Título original: A Quiet Place Part II Realização: John Krasinski Elenco: Emily Blunt, Millicent Simmonds, Cillian Murphy, Noah Jupe. Duração: 97 min. EUA, 2021