Em 2010 despediu-se com a porta entreaberta para um regresso. Mas demorou. «Terapia» (In Treatment no título original) só agora está de volta à HBO, e com uma protagonista diferente. A Metropolis teve acesso antecipado à quarta temporada, que estreia amanhã, 24.
O mundo não é hoje o que era em 2008, quando «Terapia» estreou pela primeira vez, pelo que a série também não é exatamente a mesma na sua quarta temporada (nem poderia ser). O estilo e o processo repete-se: há uma terapeuta (Uzo Aduba) que, semanalmente, encontra três pacientes bem diferentes em si. Ao longo de quatro semanas, Brooke Taylor (Aduba) explora os problemas mais ou menos complexos dos seus pacientes, enquanto o espectador tem acesso, habitualmente proibido, aos dilemas mais íntimos das personagens. Não só do trio, mas também da própria Brooke, cuja vida pessoal ecoa em todos os episódios na sequência de uma grande perda.
Eladio (Anthony Ramos, Hamilton) é o cuidador de uma família, que lhe paga as sessões para que possa ultrapassar as insónias que o atormentam. Com as barreiras levantadas para se proteger, é com Brooke que recupera alguns dos eventos mais traumáticos da sua vida (e, como percebemos depois, também da vida de Brooke). Colin (John Benjamin Hickey, The Big C) é o tipo “privilegiado e branco”, que tenta vincular a sua liberdade após uma passagem pela prisão por fraude. As suas consultas com Brooke são também um confronto, entre o que Colin mostra e aquilo que pretende esconder. Já Laila (Quintessa Swindell, Euphoria) é uma adolescente aparentemente comum, levada às sessões pela avó (Charlayne Woodard), que quer que a jovem percebe os “riscos” que corre por ser homossexual. Destinada ao sucesso, a avó vê na sua “opção” sexual (como descreve) uma escolha pelo fracasso profissional.
As três narrativas são muito interessantes, ainda que sejam ofuscadas a espaços pela vida pessoal de Brooke. Uma decisão arriscada, é certo, uma vez que «Terapia» é uma série tradicionalmente colada às sessões de terapia per se, sendo que na versão original Paul Weston (Gabriel Byrne) cruzava a storyline dos seus pacientes com as consultas com a sua própria terapeuta, Gina (Dianne Wiest). A abordagem dos novos showrunners Jennifer Schuur (Big Love, My Brilliant Friend) e Joshua Allen (Empire) pode ser encarada de duas formas: Uzo Aduba é uma atriz que dá segurança e a sua performance é assim mais complexa; o foco no seu lado pessoal “contamina” a sua experiência com o trio de pacientes. E, ainda que a segunda parte possa ser encarada de forma negativa, a verdade é que um (ou mais) acontecimento traumatizante na vida pessoal de Brooke não é indissociável de todos os setores da sua vida. Há um lado humano muito ativo em «Terapia», reforçado sobretudo pelas interações da protagonista com Rita (Liza Colón-Zayas) e Adam (Joel Kinnaman).
A pandemia de Covid-19 também atua como background da narrativa. Eladio tem sessões virtuais de terapia, há sempre uma certa distância entre as personagens e referências a desinfetantes ou máscaras. A forma como o confinamento e as limitações afetaram os envolvidos e a própria sociedade é referido a espaços, assim como o caso de George Floyd e as manifestações que se seguiram, ou outros casos mediáticos e marcantes como o de R. Kelly.
Num balanço final, é difícil dizer se «Terapia» corresponde ao que é esperado dela no seu regresso, uma vez que a experiência de quem assistiu à série original ou de novos espectadores não é geral nem mensurável. Pode falar-se, ainda assim, numa espécie de “Terapia 2.0”, que abraça as exigências do tempo em que surge para mostrar também um novo lado da narrativa. A primeira incursão de Uzo Aduba termina com um possível cliffhanger, pelo que será de esperar um possível retorno (mais rápido desta vez, esperamos).
Os primeiros episódios ficam disponíveis amanhã na HBO Portugal.