Star Wars O Despertar da Força

STAR WARS: EPISÓDIO VII – O DESPERTAR DA FORÇA

STAR WARS: EPISÓDIO VII – O DESPERTAR DA FORÇA

«Star Wars: O Despertar da Força» é um impressionante tributo de um fã para todos os fãs desta saga cinematográfica. «Star Wars» (SW) é mais do que um filme, é um fenómeno cultural que dura há quase 40 anos e que se reencontra novamente com o público sem perder a noção das suas origens, criando uma história para uma nova geração com raízes bem profundas onde tudo começou. George Lucas, o pai de SW e a actual mãe, Kathleen Kennedy, a presidente da LucasFilms, podem estar orgulhosos do magnifico trabalho do seu menino, o ultra-talentoso J.J. Abrams. Desde 30 de Outubro de 2012, aquando do anúncio que um novo SW estava para chegar, milhões de pessoas em todo mundo viram o seu relógio biológico entrar em contagem decrescente. Podemos estar descansados, a montanha não pariu um rato.

O espírito do lado negro da Força sobreviveu com mais cinismo e brutalidade após a queda do Império através da Primeira Ordem. O principal antagonista, Kylo Ren (Adam Driver), procura o paradeiro de Luke Skywalker que desapareceu após o seu “pupilo” se ter deixado seduzir pelo Lado Negro. Mas algo desperta na galáxia além do perigo do regresso de Luke Skywalker que pode impedir a progressão da Primeira Ordem, os fanáticos que sucederam o Império fazem o antigo regime parecer uns meninos de coro, são uma espécie de nazis-intergaláticos. Adam Driver que se revelou na série «Girls», e que desde aí nunca mais olhou para trás, veste um papel complicado. O seu personagem ainda não tem nesta fase a preponderância e iconografia de Darth Vader mas agora não temos apenas a voz tenebrosa e a presença, existe também um corpo que se alia a uma alma em conflito que deseja abraçar totalmente o mal.

Por outro lado, encontramos três novos heróis da série: Poe Dameron, o melhor piloto da resistência interpretado, por Oscar Isaac, um primoroso actor; o jovem Finn, o britânico John Boyega interpreta alguém que apenas quer fazer o bem; e a heroína desta saga, a impressionante Daisy Ridley no papel de Rey, que tem em cima dos ombros todos os segredos da galáxia. O papel de Rey segue o clássico percurso do herói, alguém que sonha com as estrelas e os mitos (será que os jedi são reais?) e procura encontrar a família que a deixou para trás percorrendo um caminho que irá mudar para sempre a sua vida. Uma nota para o novo e delicioso droid/side-kick, o BB-8, um engenhoso poço de gags humorísticos Destaque ainda para o veterano Harrison Ford que está com uma grande performance ao carregar no seu desempenho o espírito genuíno de SW.

O trabalho nos diálogos e argumento do veterano Lawrence Kasdan e J.J. Abrams está apurado, o reencontro com lugares comuns da narrativa SW é compensada por momentos de pura interpretação procurando temas universais como a clivagem entre pais e filhos, o nascimento de uma heroína, o enfrentar dos medos e a luta entre o bem e o mal. Apercebemo-nos que no coração da história SW está um feudo familiar que dura há décadas e que continua a ser a força motriz na nova saga que constrói um futuro com as coordenadas bem fixas no coração e nas motivações dos personagens. Existem sequências brilhantes de “acção” no filme (embora próximas da trilogia original) mas os momentos que tocam residem na interactivade entre os novos heróis e vilões com o reencontro e confronto com o passado. Uma das melhores cenas envolve apenas beleza visual e emocional e julgo que vai arrancar algumas lágrimas antes de rolarem os créditos finais, um belo final e contraponto para um reencontro tenebroso que ocorre no terceiro capítulo do filme.

A visão em IMAX mostrou a dimensão e escala da excelência e o instinto de um realizador “jedi” que controla as forças da produção e do coração estando habituado a mudar a nossa visão e o paradigma de como passamos a ver a sétima arte. Afirmava em 2011, o meu colega e amigo, o crítico Luís Salvado, a propósito da pérola que é «Super 8», que havia “sense of wonder” na criação de J.J. Abrams. Este é um autor que continua a deixar-nos estupefactos pela capacidade de realizar, produzir e compreender o lado invisível das histórias criando sólidas pontes de afinidade com a audiência. O realizador fez renascer das cinzas a saga «Star Trek» e continua nas estrelas, está sozinho na sua galáxia cinematográfica ao reconstruir e dar alento a milhões de espectadores com o novo «Star Wars».

J.J. Abrams bebeu dos clássicos e não fugiu à saga original em termos de matriz visual com uma aposta forte nos cenários reais, num cruzamento entre o minimalismo e elegância de vários sets. Veja-se as ruínas das ferramentas de destruição do Império, o Destroyer destruído na vastidão do planeta deserto de Jakku serve de mote visual e temático da obra: o renascimento do bem e do mal a partir das cinzas. Estabeleceu-se igualmente uma dicotomia nas cores, nos cenários e figurinos que distinguem as fações, vemos o branco, o vermelho e preto para a Primeira Ordem e as cores mais quentes e terrenas na resistência. Até as lentes de filmagem foram utilizadas de forma diferente, lentes modernas, para conferir frieza e austeridade à Primeira Ordem e a utilização de lentes baseadas nos filmes originais para conferir “calor humano” à resistência. A batalha dos sabres de luz não parece um jogo de computador, como acontece nas prequelas, neste “Despertar” esses momentos surgem como um bailado coreografado entre os personagens numa luta entre as trevas e a luz. A estética deu prioridade ao real aliado ao CGI somos transportados durante duas horas para um lugar onde podemos tocar e sentir no ecrã.

Ficou propositadamente muito por dizer e contar, quando saímos da sala temos a sensação que aquilo que está para vir será ainda mais gigantesco, e queremos mais! Os espectadores não devem ficar defraudados pelo carácter revisionista/tributo. O filme está longe das mal amadas prequelas e próximo da série original. É preciso contextualizar e perceber que vêm mais dois filmes na trilogia alinhados a esta história de introdução. A estética funcionou perfeitamente numa abordagem de “less is more” de J.J. Abrams e outros criadores por detrás da câmaras que entenderam que os fãs queriam estar conectados ao espírito dos filmes originais nesta épica luta galáctica entre o Bem e o Mal. A Força está connosco!

Título original: Star Wars: Episode VII – The Force Awakens Realização: J.J. Abrams Elenco: Daisy Ridley, John Boyega, Oscar Isaac, Domhnall Gleeson, Harrison Ford, Carrie Fisher, Mark Hamill, Adam Driver, Andy Serkis Duração: 138 min. EUA, 2015

[Texto originalmente publicado na Revista Metropolis nº34, Janeiro 2016]