Freddie (Park Ji-min), adotada por um casal francês há vários anos, decide viajar até à Coreia do Sul, de onde é originária. Despreocupada, leve e irresponsável, a protagonista da história pensada e realizada por Davy Chou tem um conjunto de opções inconscientes que, ainda assim, a colocam em rota de colisão com a sua própria identidade. A verdade é que, pese embora as suas dúvidas vivam submergidas no seu subconsciente, o medo que diz não ter marca a sua capacidade, ou falta dela, de agir sobre elas. No entanto, o argumento conduz Freddie até às respostas. Não absolutas, mas em permanente construção.

«Regresso a Seul» tem como fio condutor as adoções internacionais, que marcaram muito a história da Coreia do Sul, como percebemos durante a ação. Com um drama apelativo e bem construído, com leituras profundas e além da superfície, a longa-metragem é uma experiência cinematográfica. E também musical, já que a banda sonora – disponível em várias plataformas – desempenha um papel muito importante na dinâmica da narrativa. Causa reações, da calma ao stress e à tensão, espelhando o mix de provações que Freddie experiencia.

Este é o papel de estreia da artista visual Park Ji-min, que cumpre o necessário, tendo interações com personagens mais desajeitadas, o que também funciona como transparência do desconforto das situações. Por exemplo, quando Freddie fala, pela primeira vez, com um elemento do centro de adoções responsável pelo seu processo. São estes que estabelecem o contacto com os pais, indagando o seu interesse em conhecer a filha.

O argumento competente e a história bem estruturada oferecem um filme interessante, que ilustra o lado mais emotivo da questão das adoções de sul coreanos. Uma experiência com que o próprio realizador já contactou de perto, e que retrata agora num filme humano, de estímulos variados e onde a personagem principal se revela complexa e cativante para a audiência.

A história prolonga-se ao longo de oito anos, com viagens sucessivas de Freddie, que revelam a protagonista em fases diferentes da sua vida. Por sua vez, também quem interage com ela, nomeadamente o pai biológico, mostra uma evolução no seu comportamento. Uma análise interessante do modo como as relações e as descobertas têm o poder de moldar a nossa personalidade, por um lado, e a forma como recebemos o que nos acontece, por outro. Mas a viagem, mesmo que uma aprendizagem, não tem necessariamente um final feliz. Não é sobre o final, mas como lá vamos chegando.

Título original: Retour à Séoul Realização: Davy Chou Elenco: Park Ji-min, Oh Kwang-rok, Guka Han Duração: 115 min. França/Coreia do Sul/Alemanha, 2022

[Texto publicado originalmente na Revista Metropolis nº92, Abril 2023]

© AURORA-FILMS

https://www.youtube.com/watch?v=A_KEBXylK4c&feature=youtu.be
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