No ano 79 D.C., as cidades romanas de Pompeia e Herculano foram completamente obliteradas pela erupção do vulcão do monte Vesúvio que além da destruição material deixou na sua esteira dezenas de milhares de vítimas. Redescoberta no século XVI e estudada de forma mais sistemática a partir dos finais do século XVIII, a história de Pompeia e Herculano, enterradas debaixo de vários metros de detritos de poeira vulcânica apaixonaram gerações consecutivas de historiadores e romancistas, que descobriram nas ruínas vestígios e ecos de um mundo há muito desaparecido. No cinema, a catástrofe da estância balnear de Roma, serviu desde muito cedo de inspiração a dramas de proporções épicas onde, naturalmente, o culminar das narrativas é sempre a assustadora erupção do Vesúvio. Curiosamente, o grosso dos filmes tem como referência ou inspiração o romance, dos finais da era Georgiana, de Edward Bulwer-Lytton, “Os Últimos Dias de Pompeia”, um best-seller que de facto teve na sua génese o famoso quadro homónimo de Karl Brullov. A primeira versão cinematográfica do romance surge em Itália, em 1913, e passado um século sobre a sua produção continua a ser um dos mais fascinantes filmes da primeira era de ouro do cinema transalpino. Em 1935, Hollywood produziu a sua versão da história, mas Ernest B. Schoedsack e Merian C. Cooper, os pais de «King Kong», ignoraram por completo a intriga de Bulwer-Lytton retendo apenas o nome e, é claro, os elementos catastróficos do drama milenar. Durante os finais da década de 1950, com o advento do péplum, os dramas com um cenário histórico estavam na berra o que levou à produção de uma nova versão, feita à medida para os talentos do musculado Steve Reeves, esta versão foi dirigida pelo então principiante Sergio Leone. Desde então tem havido versões televisivas, documentários dramatizados e agora a versão 3D escrita, produzida e realizada por Paul W. S, Anderson, autor conhecido especialmente pelos vários capítulos do franchise Resident Evil.
E que tal é a fita, perguntará quem teve paciência de ler até aqui. Curiosamente o filme é bem melhor do que seria de esperar do homem que fez uma versão de Os Três Mosqueteiros com Zeppelins.
As personagens são saídas do molde mais básico da criação de argumentos, o herói Milo, um escravo bretão tornado gladiador para gáudio dos prazeres sanguinários da elite romana, vai encontrar Cássia, uma jovem aristocrata de Pompeia que se perde de amores por ele. Mas tal como dizem as regras das narrativas, tem de haver conflito e assim temos um vilão que é mau como as cobras, um senador de nome Corvo, que além de ser o responsável pelo massacre da tribo de Milo ainda por cima quer casar com a bela Cássia. Dir-se-ia um romance de cordel, mas Paul Anderson, que digamos em abono da verdade nunca será criticado por excessos de caracterização e densidade psicológica das suas personagens, usa a ténue intriga apenas como pano de fundo para aquilo que lhe interessa: sangue e tripas na arena – curiosamente com muito pouco grafismo, e especialmente a destruição orgásmica da cidade e dos seus habitantes. Será um filme que faz história?
Não. Mas a produção visual e a recriação de uma cidade romana do século I é particularmente detalhada e bem conseguida. Os actores fazem o que podem com o amontoado de clichés que não evoluíram grande coisa em décadas, Kiefer Sutherland destaca-se como o pérfido Corvo, Emily Browning é a ingénua de serviço e Kit Harington – o Jon Snow de «A Guerra dos Tronos», é o carismático protagonista que tem um parceiro inesperado na figura marmórea de Adewale Akinnuoye-Agbaje, um gladiador chamado Ático! A beleza e complexidade dos efeitos especiais mereciam servir uma história mais ambiciosa e elaborada em termos de personagens e situações, e que não achasse que o público tem a idade mental de um não muito inteligente miúdo de 10 anos. Porém, para quem conta os dias até ao regresso dos reis da destruição Michael Bay e Roland Emmerich, este filme é algo de imperdível!
Título original: Pompeii Realização: Paul W.S. Anderson Elenco: Kit Harington, Emily Browning, Kiefer Sutherland, Carrie-Anne Moss, Jared Harris Duração: 105 min EUA/Canadá/Alemanha/Reino Unido, 2014
[Texto originalmente publicado na revista Metropolis nº17, Fevereiro 2014]
https://www.youtube.com/watch?v=t6TRwfxDICM