«O Exorcista do Vaticano» foi lançado mundialmente no fim de semana de Páscoa [2023], desafiando a beatitude da data com a sua trama horrorífica com a desculpa de lotar as salas. «O Exorcista do Vaticano» transformou-se num inusitado êxito de bilheteria, sobretudo em países católicos.

A tensa longa-metragem, com um ocrçamento de 18 milhões US$, contabilizou cerca de 40 milhões US$ em ingressos vendidos nas suas duas primeiras semanas em cartaz pelo mundo fora. E as receitas não param de aumentar. Até ao fecho desta edição, os números de venda de bilhetes estavam em 55 milhões US$. Em 2023, êxitos como «M3Gan», «Pearl» e «13 Exorcismos» estabeleceram-se no gosto popular à força da transgressão, mostrando o quanto o horror pode ser a maior diversão. Não é por acaso, há uma espécie de nova versão (ou sequela) do filme de culto «O Exorcista» (1973) a ser rodado neste momento nos EUA, sob a direção de David Gordon Green.

«O Exorcista do Vaticano» que faz referência ao sumo pontífice católico há uma curiosidade: trata-se de terror com um herói. Quase um super-herói de batina. O seu personagem central, uma figura real, é o padre Gabriele Amorth (1925-2016), um intelectual brilhante, que foi um esgrimista da gramática numa trajetória paralela como escritor e jornalista, sem nunca ter largado a batina, desde o fim da II Guerra Mundial. Porém, ele é lembrado pelos seus deveres oficiais como inimigo juramentado do Diabo na Terra. Russell Crowe, numa interpretação em estado de graça, transforma a sua figura numa espécie de justiceiro da fé.

Com livros publicados em português como “Vade Retro, Satanás!” (ed. Canção Nova) e “Não Te Deixes Vencer Pelo Mal” (ed. Ecclesiae), Gabriele Amorth costuma ser lembrado por ter sido o Exorcista Chefe do Vaticano. Coube a ele combater manifestações até hoje contestadas pela ciência que vulnerabilizaram corpos em todo o mundo. Crendo ou não na liturgia católica (ou em qualquer credo), é impossível não se aplaudir o seu empenho humanista de defender pessoas fragilizadas de intempéries da alma, que uns chamam de surto e outros, de possessão. Em 2017, ele teve a sua história narrada pelo cineasta William Friedkin (realizador de «O Exorcista») no documentário «O Diabo e o Padre Amorth». Agora é a vez de ele virar ficção, ainda que postumamente.

«O Exorcista do Vaticano» de Julius Avery (de «Operação Overlord»), assenta no carisma de um Russell Crowe apostado em brilhar, Gabriele Amorth transforma-se em tema de um horror de raiz, sem pudor de assustar. A narrativa apela constantemente para o jump scare (susto), utilizando a carpintaria gráfica da direção de arte, da maquilhagem e efeitos visuais para mostrar que o demónio encarnado no corpo de um menino é o Diabo com D maiúsculo. É um filme para gelar a espinha. Russell Crowe demonstra uma disposição para brilhar como há muito não se via. Roger Avery, que dirigiu Sylvester Stallone em «Samaritano», tira do astro de «Gladiador» (2000) uma atuação garbosa. A trama aposta forte na hipótese da incorporação de pessoas por forças das trevas ao assumir um caso, ambientado na Espanha, no fim dos anos 1980, no qual uma viúva vinda dos EUA, Julia (Alex Essoe), tem a sua jovem criança, Henry (Peter DeSouza-Feighoney), possuído por um diabrete cujos poderes desafiam a perspicácia dos clérigos do Vaticano. Numa decisão sábia da produção de elenco, o diretor aceitou trazer Franco Nero, o eterno Django, para encarnar o Papa. Foi uma escolha perfeita.

Apoiado na fina fotografia de Khalid Mohtaseb, «O Exorcista do Vaticano» ainda abre uma discussão necessária sobre os delitos morais da Igreja, como abusos sexuais. A investigação comandada pelo sacerdote encarnado por Russell Crowe aborda negligências (reais) do passado e fala frontalmente sobre Santa Inquisição, o movimento repressor que é muito bem explicado no argumento moldado por Michael Petroni e Evan Spiliotopoulos, a partir de uma história escrita por R. Dean McCreary, Chester Hastings e Jeff Katz, baseada nas memórias do próprio Gabriele Amorth.

Título Original: The Pope’s Exorcist Realização: Julius Avery Elenco: Russell Crowe, Daniel Zovatto, Alex Essoe, Franco Nero Duração: 103 min. EUA/Reino Unido/Espanha, 2023

[Texto publicado originalmente na Revista Metropolis nº94, Junho 2023]

https://www.youtube.com/watch?v=dJ5gipu3tX0
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