O cineasta deu outra dimensão ao cinema turco, nomeadamente a partir do Festival de Cannes, onde marcou presença com 7 dos 9 filmes que realizou e onde conquistou os prémios principais, incluindo a Palma de Ouro.
Nasceu em Istambul, há exatamente 50 anos, passou a infância no interior da Turquia, numa região a norte do mar Egeu, e regressou à capital turca para concluir o secundário e os estudos superiores tendo frequentado o curso de engenharia química na Universidade Técnica de Istambul. No entanto, viviam-se tempos turbulentos e as aulas eram constantemente interrompidas por boicotes e confrontos políticos.
Durante dois anos não teve oportunidade de seguir com o curso e acabou por mudar para outra universidade, optando por engenharia elétrica. As engenharias não eram claramente a sua vocação e acabou por desenvolver um interesse por fotografia, artes visuais e música clássica.
Frequentou aulas de cinema, concluiu a sua formação e viajou para Londres e Katmandu, procurando refletir sobre o seu futuro. No regresso à Turquia, concluiu o serviço militar obrigatório e retomou a aprendizagem de cinema na universidade. Após dois anos a estudar e a tirar fotografias teve uma oportunidade de assumir um papel no elenco de uma curta-metragem de um amigo. Todo este percurso levou-o a chegar ao cinema quando já tinha mais de 30 anos…
No final de 1993, Nuri Bilge Ceylan começou a filmar a curta-metragem «Koza» (tradução livre: Casulo). O filme foi exibido no Festival de Cannes, em maio de 1995, e tornou-se na primeira curta-metragem turca a ser selecionado para a competição do festival francês.
Seguiram-se três longas-metragens descritas como integrando a ‘trilogia da província’. «Kasaba» («A Cidade Pequena», 1997), «Mayis Sikintisi» («Nuvens de Maio», 1999) e «Uzak – Longínquo» (2002). Nesses filmes, Ceylan mobilizou os seus amigos mais próximos, parentes e familiares para desempenharem as tarefas de atores e assumiu praticamente todos os papéis técnicos: a fotografia, o design de som, a produção, a edição, a escrita e a direção …

Quando «Uzak – Longínquo», o filme final da trilogia, ganhou o grande prémio do Festival de Cinema de Cannes, em 2003, Ceylan tornou-se um nome reconhecido internacionalmente. Após a estreia no festival, «Uzak – Longínquo» arrecadou um total de 47 prémios, 23 deles internacionais, e tornou-se o filme mais premiado da história do cinema turco.
O filme seguinte foi «Climas» (2006), que estreou novamente no Festival de Cinema de Cannes, desta vez conquistando o Prémio FIPRESCI, da federação internacional de críticos de cinema. Os papéis principais neste filme foram compartilhados por Nuri Bilge e a sua esposa Ebru Ceylan. Eles interpretaram a história de uma ruptura sentimental, ao sabor das estações, na tradição de Ingmar Bergman e Michelangelo Antonioni.
Em «Três Macacos» (2008), seguimos uma família despedaçada por pequenos segredos que se tornam grandes mentiras – é um filme sobre uma tentativa desesperada de manter a união familiar recusando encarar a verdade. Nuri Bilge Ceylan voltou a ser distinguido em Cannes, com o prémio de melhor realizador, e «Climas» tornou-se no primeiro filme turco a fazer parte da lista de candidatos ao Óscar de melhor filme estrangeiro.

Em 2009, o realizador turco regressou a Cannes, desta vez como membro do júri principal da competição. E dois anos mais tarde reentrou na competição com um filme rodado novamente no interior inóspito da Turquia. «Era Uma Vez na Anatólia» (2011) é a uma longa e exaustiva viagem que advogados, coveiros, polícias e um médico legista fazem pelas estepes da Anatólia em busca de um corpo. O suspeito do homicídio, guia estes homens até ao local onde sepultou o cadáver. O filme recebeu o Grande Prémio do Júri do Festival de Cannes.
De consagração em consagração… «Sono de Inverno» (2014) conquistou a Palma de Ouro no Festival de Cannes. É um drama sobre a vida conjugal, intimista, juntando num espaço confinado, durante o rigoroso inverno, um ator reformado que gere um hotel, a sua jovem mulher e a irmã que ainda lida com um divórcio recente. O hotel torna-se um refúgio para os três. Enquanto a neve vai caindo, eles vão descobrindo os seus dilemas e conflitos.
Nuri Bilge Ceylan trilhou o seu percurso emocional em oito longas metragens onde colocou personagens em confronto com a sua condição e natureza humana. Assim sucede em «A Pereira Brava» (2018), a história de um jovem autor que procura seguir a sua paixão pela literatura mas depara-se com uma complicada dinâmica familiar causada pelo vício do jogo do seu pai, o que deixa a mãe e irmã desesperadas. A sua busca de sentido e direção torna-se a fonte de longas e densas conversas que formam a estrutura emocional e intelectual do filme. Ceylan pensa sempre através do cinema que filma.
[artigo publicado na revista Metropolis nº 67 em Maio de 2019]