Uma das maravilhas do Cinema é mostrar-nos as entranhas de outras realidades. Mas, em muitos casos, estas vidas desconhecidas emergem perante nós de forma demasiado fictícia, sem profundidade. Não é o caso de «Nomadland». A obra leva-nos numa viagem pela história de nómadas norte-americanos, tendo como cicerone Frances McDormand, que interpreta Fern. Após ter perdido tudo, Fern inicia uma jornada pelo Oeste Americano, ao volante da sua caravana, vivendo como uma nómada moderna.
Ao longo da sua viagem, cruza-se com outros nómadas, outras histórias reais que vão preenchendo a narrativa de forma fluida. Tratam-se, aliás, de não-atores, com quem McDormand vai dividindo o palco, resultando em cenas de uma grande naturalidade sem perder a verdade das histórias narradas. A atriz tem em «Nomadland» mais uma interpretação marcante, procurando ir ao encontro do que os não-atores lhe davam e não o contrário. A sua entrega à personagem guia-nos durante toda a narrativa e incrementa o interesse do espectador.
A cineasta Chloé Zhao assina o argumento e realização da obra e mostra a sua grande habilidade para contar uma boa história. Em nenhum momento, Zhao cede ao lamechismo, uma via perfeitamente viável tendo em conta em narrativa e que muitos escolheriam. Ao invés disso, a cineasta apresenta uma realização honesta e sensível, que se foca em celebrar os seus protagonistas ao procurar compreendê-los, sem julgamentos.
Numa época em que, cada vez mais, a ficção se enche de efeitos especiais e de artifícios de vários géneros, é quase refrescante assistirmos a uma obra delicada, mas robusta na sua essência, que nos mostra um outro olhar de realidades sobre as quais não conhecemos assim tanto. Porque seja qual for a história que um filme tenha para nos contar, é especialmente gratificante quando, no fim, sentimos que essa obra nos tenha dado algo de novo. E é exatamente isso que «Nomadland» proporciona.
Título original: Nomadland Realização: Chloé Zhao Elenco: Frances McDormand, Gay DeForest, Patricia Grier. 108 min. EUA, 2020