É impossível ver « A Mulher à Janela» (2021) sem pensar, quase de imediato, em filmes como «Janela Indiscreta» (1954) e «Cópia Mortal» (1995). Desde logo porque a protagonista Anna Fox (Amy Adams) está limitada no espaço do seu apartamento; além de sofrer de agorafobia, a psicóloga mostra traços de ansiedade e forte medicação, o que condiciona o seu comportamento. E, como sabemos, a ficção é fértil no desenvolvimento de personagens que, por via do seu contexto, têm tendência a revelar uma paranoia mais ou menos intensa.

Anna, uma mulher recentemente separada, tem novos vizinhos, os Russell, e, apesar da sua relutância, acaba por estabelecer relações com Ethan (Fred Hechinger) e Jane (Julianne Moore). Isto depois de os observar a partir da sua janela, assim como faz com outros vizinhos. Já o patriarca, Alistair (Gary Oldman), não lhe inspira confiança alguma. Quando acredita ver Jane assassinada à sua frente, Anna procura desesperadamente ajuda. Mas será que alguém acredita nela?

O seu inquilino David (Wyatt Russell), que mora na cave, é um apoio ocasionalmente, mas o seu papel não é imediatamente claro. Como tal, também a audiência vai encontrando desconfianças entre as personagens que se cruzam com Anna. Nem mesmo os inspetores, interpretados por Brian Tyree Henry e Jeanine Serralles, são particularmente reconfortantes.

O que haverá de novo para contar em mais um filme sobre uma protagonista desconfiada dos seus vizinhos? Onde termina a sua ilusão e começa a realidade? Até que ponto o espectador pode confiar no que ela diz? As perguntas sucedem-se e, no arranque da longa-metragem, o argumento e a realização até conseguem equilibrar-se para manter o interesse da audiência.

O pior é depois. São muitas as pontas soltas que, na ausência do contexto do livro de A.J. Finn que lhe deu origem, ficam por resolver. É certo que comparar cinema e literatura é sempre injusto, mas faz parte do trabalho de adaptação tornar a história clara para o espectador, ainda que tenha de descartar alguns acontecimentos (o argumento é de Tracy Letts, que também participa no filme como o terapeuta de Anna). Com o passado de Anna e a sua relação com os Russell explorada apenas à superfície, é difícil ficar agarrado pela narrativa, e estabelecer casualidade entre aquilo a que assistimos.

O impacto das personagens coadjuvantes em Anna é inferido e não expressivo. É preciso imaginar e completar, assim, o que o filme não desenvolve. E nem a prestação bem conseguida de Amy Adams ofusca o quão à superfície ficou a criação da sua protagonista. O seu monólogo acusatório, numa das cenas mais importantes da ação, é demasiado teatral e a realização de Joe Wright (Expiação, A Hora Mais Negra, Anna Karenina) – até ali mais “estática” – assume um papel ativo que não tinha tido até ali e não volta a repetir. Na tentativa de ser belo, prova alguma incoerência e acaba por distrair o impacto das palavras que Anna diz.

Aquele que poderia ser um thriller contagioso acaba, em vez disso, por ser um breve produto de entretenimento sem impacto. Também porque, como foi dito na abertura, já muito foi feito com o mesmo “material”, e melhor. O acontecimento mais curioso é que, por causa do confinamento que marcou o último ano, os espectadores podem até sentir uma certa empatia pela personagem.

Título original: The Woman in the Window Realização: Joe Wright Elenco: Amy Adams, Gary Oldman, Wyatt Russell. Duração: 100 min. EUA, 2021

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