«Minari» é simultaneamente um filme previsível e imprevisível. Isto porque apesar de partir de um ponto de vista menos habitual, o de uma família de imigrantes coreanos na América, a forma como (re)trabalha o mito do sonho americano, do self-made man, da luta solitária do homem contra a natureza agreste, etc., tudo isso se parece bastante com qualquer coisa que já vimos antes. Por outro lado, num contexto em que um pouco por todo o mundo (a começar por Portugal) as questões do racismo e da xenofobia estão, pelas piores razões, na ordem do dia, surpreendentemente «Minari» passa quase totalmente ao lado do tema, escolhendo centrar-se sobre os dilemas e tensões internas dos seus protagonistas.

É evidente que a arte, neste caso o cinema, não está obrigada a reflectir o presente nem a ser um documento do passado, nada disso. Contudo, as escolhas do realizador e argumentista, Lee Isaac Chung, ele próprio filho de imigrantes coreanos, parecem-me enredadas numa espécie de nuvem nostálgica que bloqueia qualquer coisa de real. No meio do exercício da escrita do argumento de «Minari», Chung terá talvez pesado mal a relação entre os elementos autobiográficos da história e a multiplicação de pequenos “sketches” (a avozinha que gosta de ver luta livre na TV e não sabe fazer bolachas) ou parábolas (como aquela que dá título ao filme), acabando por diminuir a força das suas personagens – ainda assim muito bem defendidas pelos actores que lhes dão vida, dos mais novos aos mais velhos. Do mesmo modo, o uso da música e o tipo de enquadramentos e movimentos de câmara à la Malick provocam um certo enjoo nos espectadores mais sensíveis.

Com 6 nomeações para os Oscars, vencedor na categoria de melhor actriz secundária para Yuh-jung Youn, é preciso dizer que a visibilidade alcançada por «Minari» atesta menos uma mudança de estratégia na indústria hollywoodesca, que não se sabe se é apenas circunstancial (não são todas?), mas é a prova, isso sim, de que, também no cinema, a assimilação cultural é uma realidade.

Título original: Minari Realização: Lee Isaac Chung Elenco: Steven Yeun, Yeri Han, Alan S. Kim. Duração: 115 min. EUA, 2020

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