Metropolis 98
Além da grande máquina de marketing que se instalou mundialmente e que levou às salas até quem não faz ideia do que trata o filme de Greta Gerwig ou, inclusive, que boneca era a Barbie e o que significou para uma determinada geração, não deixa de ser interessante que um filme que coloca o foco numa boneca vs. realidade seja um dos maiores êxitos de bilheteira de todos os tempos. Isto numa altura em que a greve dos atores debate, precisamente, o elemento “boneco” que querem criar de si próprios. Os atores da grande máquina americana, que se juntaram à greve dos argumentistas iniciada em julho para reclamar melhores condições de trabalho, revoltam-se precisamente pelo facto de os Estúdios quererem socorrer-se de ferramentas de Inteligência Artificial para escrever argumentos e para duplicar e guardar a imagem de atores, de forma a serem usados quando quiserem, sem que os mesmos possam lucrar ou ter poder sobre isso.
Quando um filme pretende mostrar que o ser humano deve aceitar ser o que é, que deve assumir as suas imperfeições (e não vê-las como tal), e muito menos deixar-se sujeitar pelo poder dos outros, não deixa de ser irónico a indústria querer precisamente assumir a perfeição que a tecnologia é capaz de gerar, rejuvenescendo atores ou trazendo “à vida” outros que já faleceram.
É cada vez menor a distância entre máquina e “homem”, e se os humanos não perceberem que a dita perfeição está na autenticidade e originalidade, e que só isso nos pode efetivamente diferenciar, cairemos todos no erro de nos tornarmos “bonecos”, à mercê do que alguém definir como sendo o bom e o perfeito.
SARA AFONSO