Rodado em plena pandemia, no ano passado, «Men» assinala o regresso de Alex Garland à realização, quando ainda está bem fresca a distopia de «Ex -Machina» com Alicia Vikander. Agora a protagonista é a atriz do momento, Jessie Buckley, registo surpreendente em «A Filha Perdida». O resultado é um registo entre o terror e o drama psicológico focado na condição da mulher num mundo predominantemente masculino e profundamente “tóxico”, escrito e realizado por Alex Garland.

A linha narrativa é simples: Harper é uma mulher marcada pela perda e pelo trauma recente do suicídio do marido e parte para o interior britânico, para uma casa de campo, em busca de apaziguar a dor e curar as feridas interiores. O cenário, aparentemente tranquilo e idílico, é enganador. Recebida pelo excêntrico proprietário da imponente casa, Geoffrey, personagem interpretada pelo experiente ator britânico Rory Kinnear, Harper é uma mulher isolada numa enorme propriedade, longe de tudo, rodeada de figuras estranhas, todas elas homens e nada simpáticos com a sua situação.

A atmosfera de mistério vai crescendo à medida que a nossa protagonista se aventura para lá das quatro paredes da casa onde se instalou. A montagem paralela alterna entre as situações que Harper vai enfrentando na pequena localidade e as reminiscências das últimas horas no dia da morte do marido, pesadelo com o qual tem de lidar, de forma permanente. Primeiro, o homem nu, aparentemente desprovido de razão, que a persegue até à casa alugada e que deixa em estado de choque e vai ser detonador de um turbilhão de emoções descontroladas. É o início duma série de encontros com os homens da aldeia: o rol de personagens bizarras desfila e confronta Harper com a sua “culpa” na morte do marido, pois é acusada de ser a responsável desse trágico desfecho. Todos estes homens da aldeia – o pároco, o polícia ou o anão – constituem uma espécie de coro julgador que decide condenar a jovem mulher. Todos homens. Todos carregados de preconceitos sobre a condição da mulher e os deveres conjugais que a acusam de não ter cumprido.

A composição intensa de Jessie Buckley é um dos trunfos de «Men», a sua personagem é desafiada a situações de tensão e perigo capazes de convencer o espetador mais cético da sua condição, só e perdida, numa pequena povoação rodeada apenas de homens que já decretaram a sua pena. Harper e a sua capacidade de luta e sacrifício para escapar da sentença de morte que lhe querem impor é uma das marcas fortes do filme. Ao mesmo tempo, é decisivo destacar a presença forte de Rory Kinnear, ator multifacetado, contraponto da protagonista, num registo exuberante e complexo de proprietário da casa de campo, no interior britânico.

Á frente de tudo isto, Alex Garland é o maestro deste retrato implacável da sociedade contemporânea, camuflado de filme de terror e suspense, numa construção inteligente e com um ritmo aterrorizador, servido por um elenco curto, mas eficaz, e por uma produção assinalável. Definitivamente, um filme a ver numa sala perto de si.

Título original: Men Realização: Alex Garland Elenco: Jessie Buckley, Rory Kinnear, Paapa Essiedu Duração: 100 min. Reino Unido, 2022

https://www.youtube.com/watch?v=pt81CJcWZy8
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