A alegria é a coisa mais séria da vida. É improvável que Paul Thomas Anderson se tenha alguma vez cruzado com Almada Negreiros e, contudo, «Licorice Pizza» parece ser o gémeo fílmico desse maravilhoso aforismo. Metade sonhado, metade vivido, o filme é uma ode à juventude, à liberdade de experimentar, arriscar, cair e levantar, uma e outra vez.
Em estreia absoluta no grande ecrã, Alana Haim (membro da banda HAIM) e Copper Hoffman (filho de Philip Seymour Hoffman) são a dupla romântica improvável. Ele tem 15 anos (quase 16) e ela 25 (mais coisa menos coisa). Ele é o chamado “fura-vidas”, com tanques de confiança para dar e vender. Ela parece enfadada com tudo e esconde mal a inquietação de quem há muito espera… qualquer coisa. Os dois juntos resultam numa mistura explosiva de energia, graça e espontaneidade. Não admira que a câmara os siga para todo o lado. E mesmo quando entram em cena grandes estrelas como Bradley Cooper ou Sean Penn (com excelentes participações), são os rostos de Alana e Hoffman que procuramos.
«Licorice Pizza» marca o regresso de Paul Thomas Anderson ao Valley nos anos 70 («Jogos de Prazer», «Vício Intrínseco»). As ruas fervilham de vida, o suor dos corpos reflecte o brilho do sol e tudo parece possível. A cena em que Alana conduz, sem combustível, um enorme camião em marcha-atrás por uma colina cheia de curvas e contracurvas apertadas é a metáfora perfeita para esta história, feita de pequenos episódios. De vez em quando, por entre negócios de venda de colchões de água e máquinas de pinball, espreita a depressão, as detenções abusivas, a crise do petróleo. Mas tudo isto é contexto (e subtexto). Nada disto se sobrepõe à alegria.
Como já outros disseram, «Licorice Pizza» era o filme de que estávamos a precisar.
Título original: Licorice Pizza Realização: Paul Thomas Anderson Elenco: Alana Haim, Cooper Hoffman, Sean Penn, Tom Waits Duração: 133 min EUA/Canadá, 2021
https://www.youtube.com/watch?v=UvHKXYorBrc&t=6s