«Gojira», ou «Godzilla», como é conhecido por estes lados, continua a ser um filme monstruoso quase 70 anos após a sua estreia. Não que seja um uma obra-prima do cinema (embora seja um indiscutível filme de culto em toda a sua excelência), mas porque, para todos os efeitos, definiu as regras do género e influenciou todos os outros monstros que se seguiram. Aliás, ele próprio deu origem a um franchise que ainda hoje se eleva como um dos mais longos da história do cinema, numa sequência sem fim de versões, sequelas e remakes.
A história começa quando um barco de pesca é destruído ao largo da costa do Japão. E o navio que é enviado para investigar a ocorrência tem o mesmo destino. Ao mesmo tempo, as redes de pesca começam a aparecer vazias. Há algo no mar que na mente dos mais idosos só pode ser atribuído a uma antiga lenda: um monstro marinho conhecido como Gojira. Mas à luz dos mais racionais da aldeia, tal não passa de folclore. Isto, claro, até uma noite de tempestade trazer à costa a gigante criatura que num prazo de poucas horas destrói uma série de casas e mata duas mãos cheias de de pessoas. Avistado por alguns habitantes, a lenda torna-se real e Tóquio envia para o local um paleontólogo para conduzir a investigação. Entre as primeiras evidências estão os elevados níveis de radiação no local e uma pequena criatura pré-histórica há muito considerada extinta. Conclusão da investigação: uma criatura marinha (que a certo ponto da sua evolução se tornou anfíbia) foi despertada do sono por testes nucleares subaquáticos.
E é neste ponto que «Gojira» ganha significado. Por altura da sua produção, já passaram uns anos desde o fim da Segunda Guerra Mundial, em particular sobre o lançamento das duas bombas atómicas sobre o Japão. No entanto, não só a memória persiste, como a preocupação com os perigos do poder atómico está em crescendo. Neste contexto, «Gojira» chega-se à frente como uma poderosa metáfora sobre a capacidade destrutiva do Homem e as suas consequências directas no mundo natural. Não é uma metáfora muito subtil, verdade seja dita. No entanto, é o fulcro emocional do filme que o torna relevante ainda nos dias de hoje.
Já os efeitos especiais, bem, tem de se ter em consideração o tempo que já passou. Para a época, a conjugação de várias técnicas e respectivos resultados é um feito incrível. As personagens têm dimensão humana, mas sofrem com uma narrativa que por vezes se arrasta. Em compensação, a realização de Ishirō Honda leva o filme a bom porto com a ajuda de excelentes efeitos sonoros e uma banda sonora a condizer. Marco Oliveira