Não tenho a certeza que «Desligados», o título português de Disconnect, corresponda à intenção original dos criadores do filme. Antes do mais, porque não creio que faça muito sentido chamar «Desligados» a uma teia de histórias em que aquilo que aproxima as personagens é, antes de tudo o mais, o facto de estabelecerem as mais diversas ligações pela Internet – isto é, o facto de estarem… ligados. Mas sobretudo porque, estando essas histórias marcadas pelo mais perturbante dramatismo, não será abusivo supor que o título se conjuga num tempo imperativo: “Desliga!” (como quem diz: “Desliga antes que sejas apanhados!”).

Não quero com estas observações diminuir um filme que me parece uma das maiores e mais gratificantes surpresas de todo o corrente ano cinematográfico. Trata-se apenas de tentar vislumbrar a dinâmica interna de um objecto que, de facto, consegue abordar as ligações “sociais” que a Internet pode favorecer, deixando-nos a mais básica, e também mais perturbante, das interrogações: afinal de contas, quando nos ligamos através dos mais diversos elos virtuais, que sociedade estamos a construir? Ou que sociedade imaginamos?

Passam por aqui os mais diversos “desvios” informáticos, desde os estudantes do liceu que difundem imagens comprometedoras de um colega, até ao jovem que vive integrado num esquema de encontros “eróticos” online, passando pela mulher que é apanhada num “chat” onde lhe roubam os dados do seu cartão de crédito…

Há em Disconnect um espantoso efeito de verdade, antes do mais enraizado num riquíssimo trabalho de direcção de actores. Em todo o caso, não se pense que o filme de Henry Alex Rubin, alicerçado num subtil argumento assinado por Andrew Stern, se satisfaz com qualquer visão panfletária das relações “em rede”, porventura na tentativa de separar os “puros” e os “impuros”.

Esta é uma narrativa global, sem heróis nem anti-heróis, apreendendo o estado das coisas num tempo em que a saturação de canais de comunicação é tão significativa quanto as possibilidades de informação e conhecimento associadas a esses mesmo canais. Em última instância, estamos perante uma outra interrogação, ainda mais drástica: qual é a nossa identidade quando somos, apenas e só, um impulso electrónico que se repercute algures, num cenário que desconhecemos?

Título original: Disconnect Realização: Henry Alex Rubin Elenco: Jason Bateman, Hope Davis, Frank Grillo, Andrea Riseborough Duração: 115 min EUA, 2013

[Texto originalmente publicado na revista Metropolis nº14, Novembro 2013]

https://www.youtube.com/watch?v=XlE3g7KCq4A
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