[Crítica originalmente publicada na revista Metropolis nº20, Junho 2014]

Depois de 10 anos afastado do grande ecrã, Jonathan Glazer regressa para nos surpreender com «Debaixo da Pele», um filme que partilha a mesma natureza bela e obscura da sua protagonista. Scarlett Johansson é quem dá corpo à personagem sem nome – talvez se pudesse chamar sexy beast? –, uma jovem e misteriosa mulher que à noite, numa carrinha branca, percorre as ruas de Glasgow, do centro à periferia, pedindo direcções e oferecendo boleia a homens que caminham sozinhos. Mas ela não está realmente perdida, pelo menos não a princípio. Somos nós que nunca chegamos a saber quem ela é ou o que faz aqui. De entre as várias hipóteses apontadas, a minha preferida continua a ser a de que ela é um turista sexual intergaláctico de visita ao planeta Terra.

O minúsculo pontinho branco que vemos no centro da tela no início do filme pode muito bem ser a estrela que ilumina o seu planeta distante. «Sexy Beast» (2000), o primeiro filme de Glazer, começa, justamente, com um plano do sol muito semelhante. Mas o parentesco de «Debaixo da Pele» não deve ser procurado nos filmes anteriores do realizador; trata-se claramente de um filho único, excêntrico e autocentrado. A avaliar pelas diferentes estéticas que se misturam de forma quase perfeita no filme, a última década fez de Glazer um autor muito mais sensível e sofisticado. Isto fica claro desde logo no uso perturbante que ele faz da música (da autoria de Mica Levi), na mestria com que combina o documentário e a ficção-científica, actores não profissionais e uma estrela de Hollywood, luz natural e CGI. São estes elementos opostos que aliados a uma montagem expressiva dão vida a uma história ambígua que nos persegue já fora da sala.

Simples dispositivos, como câmaras escondidas na rua, na carrinha ou num centro comercial, transformam inesperadamente a nossa visão do mundo. Notável é também a representação minimalista oferecida por Scarlett Johansson, o modo como usa o seu corpo como instrumento, experimentando-o, testando os seus limites mesmo quando esboça apenas um sorriso. Tal como esta personagem, somos uma nova espécie de estrangeiros na Terra, levados pela curiosidade a sair da nossa pele para descobrirmos uma relação livre com o que vemos, com o objecto fílmico, a sua estranheza, o seu assombro. Se ficarmos presos ao habitual sistema de percepção, ao vício da narrativa clássica, vamos perder muito da viagem que o filme convida a fazer. O filme teve uma estreia limitada a duas salas no país, mas quem está mais longe deve mesmo considerar o risco de apanhar uma boleia só para ver «Debaixo da Pele».

Título Original: Under the Skin Realização: Jonathan Glazer Elenco: Scarlett Johansson, Jeremy McWilliams, Lynsey Taylor Mackay. Duração: 108 min. Reino Unido/Suiça, 2013

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