«Chamem-me Dolemite», da Netflix, assinalou a 7 de Setembro de 2019 o regresso de Eddie Murphy às luzes da ribalta. A estreia mundial ocorreu no Festival de Toronto onde a METROPOLIS marcava presença habitual com Rui Pedro Tendinha que apontou o filme como uma das apostas do certame. A realização pertenceu a Craig Brewer (autor dos imperdíveis «Hustle & Flow» e «Black Snake Moan»), Scott Alexander e Larry Karaszewski («Larry Flint» e «Ed Wood») assinaram o argumento. A ideia já tinha sido proposta pelos escritores, em 2002, a Eddie Murphy mas o projecto não avançou na altura.

«Chamem-me Dolemite» é ao mesmo tempo um tributo carregado de humor e empreendedorismo mas também uma luta perante a mais cruel das adversidades, o racismo e a discriminação sistemática. Eddie Murphy interpretou uma figura real, um comediante underground dos anos 1970, Rudy Ray Moore, um homem que vivia em Los Angeles com o inconformismo de nunca ter alcançado a fama e o sucesso que esperava com a sua chegada, anos antes, à cidade das estrelas. Estando encalhado como subgerente de uma loja de discos, um fruto do acaso levou-o a mudar o seu número de stand-up com um novo reportório repleto de obscenidades. A sua “boca de esgoto” tornou-o imensamente popular nas comunidades urbanas de afro-americanos espalhadas pelos Estados Unidos. Mas Rudy Ray Moore, que se assumia em palco como Dolomite, não queria ficar pelo sucesso dos clubes e dos discos de comédia… Ele encetou com um grupo de amigos, a sua “família”, uma carreira no cinema criando do seu próprio bolso uma verdadeira e mirabolante produção de guerrilha à boleia do blaxploitation num cocktail chunga de meretrizes, karaté, corrupção e supremacia branca. Rudy Ray Moore apostou tudo no projecto, o sonho e a carreira. Mas o melhor mesmo é verem «Chamem-me Dolemite» para perceberem o trajecto desvairado deste homem e como tudo terminou. A recriação fantástica deste projeto surge na segunda metade do filme, é ver para acreditar! Também surge no ecrã outro actor “perdido”, Wesley Snipes, que sempre teve uma veia dramática, e que finalmente se reúne em cena com Eddie Murphy, com um belíssimo resultado.

Como muitos, cresci a idolatrar Eddie Murphy. Acompanhei-o na sua senda de sucessos de comédia e a acção nos anos 1980 que depois foram definhando a partir dos anos 1990, com algumas excepções de box-office. Pensava que o fenómeno teria os dias contados e que ele estaria a viver de royalties. Estava redondamente enganado, este filme marcou finalmente o ambicionado regresso ao melhor de Eddie Murphy. «Chamem-me Dolemite» é uma obra com garra e fé. É evidente que o actor está totalmente investido no projecto, parece possuído pela figura e o espírito do maverick Rudy Ray Moore, um artista que Murphy admirava profundamente.

Sabemos que a comédia desgarrada sempre foi a praia de Eddie Murphy, desde os tempos em que fazia stand-up nos clubes de Long Island, com apenas 15 anos, mas o que nos surpreende neste filme é a introdução do drama existencial, a procura do significado e o desejo de reescrever o destino numa batalha contra as forças do sistema. Relembramos que Eddie Murphy já tinha mostrado essa faceta dramática em «Dreamgirls» (2007) onde foi nomeado para o Óscar de Melhor Actor Secundário.

Antes mesmo do levantamento popular e universal do movimento Black Lives Matter, em 2020, o passado teve apontamentos e várias formas de expressão e inconformismo contra o racismo enraizado no sistema norte-americano. O cinema ficcional e documental e até a televisão têm nos tempos mais recentes apresentado vários exemplos de luta e inconformidade. Rudy Ray Moore é um símbolo disso mesmo.

«Chamem-me Dolemite» apresenta a vida de Rudy Ray Moore, um génio e um pioneiro através, justamente, de uma outra lenda, um gigante, Eddie Murphy, uma das maiores figuras afro-americanas dos últimos 40 anos, numa história sobre acreditar em si mesmos que nos faz acreditar em nós mesmos.

Título original: Dolemite Is My Name Realização: Craig Brewer Elenco: Eddie Murphy, Keegan-Michael Key, Mike Epps, Wesley Snipes, Chris Rock, Craig Robinson. Duração: 118 min. EUA, 2019

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