«As Marvels» volta a revitalizar o cinema de super-heróis do melhor estúdio do género. Baseado na conexão entre os personagens, que são a pedra basilar para o sucesso desta obra, o filme leva-nos a novos píncaros de entretenimento. A trama central e os efeitos visuais são um complemento a uma aventura sci-fi com ênfase na amizade e no poder no feminino. O desígnio deste “girl power” surge como algo natural, genuíno e plenamente afectivo. O filme tem a capacidade de desenvolver frenéticas sequências de acção ao mesmo tempo que explora as relações afectivas entre três mulheres que assumem total protagonismo. As três actrizes estão mesmo em sintomia, e houve um investimento visual e narrativo para demonstrar essa química entre elas.
O lado mais emocional do filme explora a relação de Carol Danvers/Capitã Marvel (Brie Larson) com Monica Rambeau (a promissora Teyonah Parris de «Clonaram o Tyrone»). Carol é a “tia” e melhor amiga da família que desapareceu da Terra para explorar o universo quando Mónica era uma criança. O filme é marcado por esse reencontro de Carol e Mónica, examinando as emoções e as mágoas debaixo do estatuto de super-heróis.
O coração desta obra é a relação (e diversão para os nossos olhos) entre Kamala Khan/Ms. Marvel (Iman Vellani rouba o filme) e a Capitã Marvel. Kamala é absolutamente fanática por esta heroína, é um encontro que desencadeia uma onda gigante de entusiasmo e carinho, esta conexão contagia o filme. E o filme antecipa essa relação num fabuloso trecho animado que abre esta obra, é uma sequência fantástica e original (é incrível em IMAX 3D), um momento que também presta tributo à banda-desenhada que está na base do universo Marvel.
A introdução de Kamala Khan/Ms. Marvel é uma injecção de energia que faltava ao universo cinematográfico Marvel. A sua série da Disney+, «Ms. Marvel» (2022), é aclamada precisamente por trazer esse sabor de diferenciação e autenticidade. E Kamala não surge a solo no filme, a sua família viaja consigo nesta aventura. Eles são um condimento extra e delicioso onde se explora a dinâmica dos estreitos laços de uma família asiática no contexto de um blockbuster.
Em paralelo, a trama do filme envolve uma vingança interplanetária e apocalíptica onde a Capitã Marvel tem um papel central. É um daqueles casos onde o passado regressa para ameaçar o futuro e tudo aquilo que ela ama. «As Marvels» marca a melhor interpretação de Brie Larson no papel da personagem Carol Danvers/Capitã Marvel e explica um pouco o seu ar carrancudo e a falta de empatia nos filmes anteriores. É algo que está bem explicado nos comics, sobretudo na fase 2010-2020, no cinema foi sempre uma interrogação do porquê da personagem ser tão depressiva, o filme revela as razões da sua dor e melancolia. Samuel L. Jackson também dá o ar da sua graça com o seu personagem, Nick Fury, depois da desastrosa série «Secret Invasion», ele está num registo mais leve e humorado.
«As Marvels» é o regresso à fórmula vencedora. O filme é mais curto e a sua consistência é perfeita, diverte e não satura numa narrativa directa que não baralha a audiência. O investimento nos personagens e nas suas emoções foi o trilho certo para esta aventura. O filme tem ainda o dom de abrir o terreno para outras pistas do universo cinematográfico Marvel.
A realizadora e co-argumentista, Nia daCosta, está de parabéns por ter conseguido realizar um filme equilibrado, que exprime uma história e uma sensibilidade feminina com lugar para acção interplanetária como também para a intimidade e as emoções. «As Marvels» parece um comic vintage com todos os ingredientes que sempre fizeram da Marvel uma marca de sucesso.
Título original: The Marvels Realização: Nia DaCosta Elenco: Brie Larson, Iman Vellani, Teyonah Parris, Samuel L. Jackson, Zawe Ashton Duração: 105 min. EUA, 2023
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