«007 – Sem Tempo Para Morrer» é imperdível e apoteótico, um clássico instantâneo na saga James Bond. Daniel Craig despediu-se, como começou, com as emoções ao rubro. Após dezoito meses de sucessivos adiamentos, temos todo o tempo do mundo para desfrutar de um filme assim. 

Os guardiões do franchising 007, Barbara Broccoli e o seu meio-irmão Michael G. Wilson, possuidores de um invejável controlo criativo da série, podem-se orgulhar de um esplêndido arco narrativo com Daniel Craig como figura de proa de uma produção com altíssimos valores criativos e artísticos. 

A história desenvolvida por Neal Purvis e Robert Wade, desde Casino Royale, humanizou o agente de Sua Majestade e trouxe à série temas de peso criando um personagem ultra complexo. A vingança, a traição, os segredos e a morte de quem se ama determinaram os desígnios deste James Bond ao longo dos últimos cinco filmes. O fascinante tomo desta saga iniciou-se em «Casino Royale» com a estreia de Daniel Craig no papel de 007. O desaparecimento e os fantasmas de Vesper Lynd (Eva Green) em «Casino Royale» e «Quantum of Solace», a relação com M (Judi Dench) em «Skyfall», a revelação de Blofeld (Christoph Waltz) e o voltar a amar com Madeleine (Léa Seydoux) iniciado em «Spectre» desaguam em «007 – Sem Tempo Para Morrer». E Madeleine será a chave para todos os enigmas…

Cary Fukunaga é o primeiro americano a dirigir um filme da saga. As suas criações têm cunho de autor como realizador e argumentista, o flashback de Madeleine, antes dos créditos iniciais, temtêm a mesma tensão que vimos na direcção da primeira temporada de «True Dectetive» (2014), o lado mais cru deste enredo remete-nos para o seu melhor filme «Sem Nome» (2009). A sua missão era continuar a conexão emocional dos espectadores com o personagem, que foi alcançada mais pela história do que o permanente equilíbrio com a adrenalina da acção e dos efeitos especiais que continuam a ser de topo. Carey Fukinaga cumpriu com mérito a tarefa entre mãos, atingiu e executou a realização com auma perícia de um “Double O”. O realizador teve a preciosa ajuda de uma argumentista em estado de graça -– Phoebe Waller-Bridge -– autora de duas extraordinárias criações, «Fleabag» e «Killing Eve». A argumentista britânica incutiu neste filme personagens e uma história mais íntima sob a batuta dos sentimentos. Os habituais colaboradores Neal Purvis e Robert Wade, na série desde 1999 («007 – O Mundo Não Chega»), também assinaram o argumento.

O excepcional tema musical “No Time to Die” de Billie Eilish, escrito a meias com o irmão Finneas O’Connell, e a orquestração mais subtil de Hans Zimmer com o auxílio de Johnny Marr (eEx-guitarrista dos The Smiths) conferiram um sentimento trágico de melancolia e romance inacabado que perdura ao longo da obra.   

Rami Malek não me convenceu com a sua performance no papel do antagonista Lyutsifer Safin, ficou atrás dos últimos vilões de Bond: Mads Mikkelsen, Mathieu Amalric, Javier Bardem e Christoph Waltz. É uma interpretação menos insidiosa e pouco conseguida mas entende-se a origem por oposição ao carácter de James Bond. Penso que o principal motivo desta interpretação menos conseguida não foi tanto por defeito de Rami Malek mas por mérito da química entre Léa Seydoux e Daniel Craig que, juntos ou à distância, são magnéticos e polarizaram em absoluto o filme, tudo parece secundário ao pé de ambos. Uma nota para a pequena mas simpática presença de Ana de Armas no papel de Paloma.

O filme apoia-se menos no lado épico e mais no conceito de thriller de acção mas não deixa de ter sequências arrebatadoras dignas da mitologia de 007. As principais sequências de acção estabeleceram as balizas de «007 – Sem Tempo Para Morrer», a sequência inicial em Itália combinou a velocidade, o perigo e a traição. Já o clímax do filme remete-nos para os grandes clássicos da série num final que sintetizou na perfeição a gloriosa passagem de Daniel Craig pela saga 007. 

O filme ata as pontas soltas, sublinha a crueldade do destino de um herói corroído pelo desgosto e o remorso, e movido pela vingança. Apesar de ser tudo pessoal, este não hesita em colocar a sua vida em perigo para salvar o mundo dos monstros que o assolam na sombra. Na vigência de Daniel Craig ficará para sempre a noção de um personagem que tem as marcas de água de um passado épico mas que trouxe consigo uma ideia de complexidade e intensidade narrativa, o empoderamento das mulheres, o maior envolvimento dos personagens secundários (a “família” Bond no MI6), o seu carácter estoico perante a adversidade e o trauma que esculpiu um titã no grande ecrã. O filme é muito mais do que uma aventura para impedir que uma arma diabólica caia nas mãos erradas. «007 – Sem Tempo Para Morrer» é um romance de acção e uma história intensamente pessoal que marcou o fim de uma era singular na mitologia de James Bond. 

Título original: No Time to Die Realização: Cary Joji Fukunaga Elenco: Daniel Craig, Léa Seydoux, Rami Malek, Lashana Lynch, Ralph Fiennes, Ben Whishaw, Naomie Harris, Jeffrey Wright, Rory Kinnear, Christoph Waltz. Duração: 163 min. Reino Unido/EUA, 2021
Tema musical: “No Time to Die” – interpretação de Billie Eilish, letra Billie Eilish O’Connell / Finneas Baird O’Connell

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