Durante décadas este «007 – Ao Serviço de Sua Majestade», o sexto filme do mais rentável franchise da história do cinema, foi considerado o patinho feio de uma família que, diga-se em abono da verdade, tem muito mais patos bravos do que cisnes. Dirigido em 1969, por Peter R. Hunt, esta adaptação do romance homónimo de Ian Fleming foi o primeiro a ser protagonizado por George Lazenby – um ex-modelo e actor australiano de recursos dramáticos algo limitados a quem foi pedido que seguisse as pegadas do icónico Sean Connery, que entretanto tinha decidido que estava a sufocar a sua carreira ao só interpretar Bond. Como sabemos Connery voltaria ao papel que o tornou famoso não uma mas duas vezes mais. Mas em 1969 estava tudo apostado em Lazenby, que até tinha o porte do bon vivant sedutor mas que teve o azar de protagonizar a adaptação do romance onde Fleming decidiu revelar uma faceta mais humana do espião com ordem para matar. De facto, descobrimos neste filme uma dimensão de Bond que só voltaríamos a vislumbrar na encarnação de Daniel Craig quase 4 décadas mais tarde. Bond, apaixona-se em Lisboa – mais propriamente na linha do Estoril, pela bela mas errática condessa Teresa di Vicenzo (Diana Rigg), com quem vem a casar. Mas entretanto o seu arqui-inimigo, o implacável Ernst Stravos Blofeld, ameaça esterilizar as reservas de comida do mundo pela mão de um grupo de belas modelos a que chama os seus anjos da morte, se as autoridades não lhe derem um indulto total pelos seus crimes passados. O filme combina a habitual receita de locais exóticos, sensualidade, acção e muitos efeitos especiais, com algo então inédito na série – um elemento de realismo, que voltou a ser tentado de forma falhada nos filmes com Timothy Dalton, mas que só fruiria completamente com Daniel Craig. O público de 1969 não estava interessado em realismo, e muito menos que o seu herói ficasse abalado pelo assassínio da sua amada. Peter R. Hunt, que já tinha sido o montador de outros filmes da série, assinou uma aventura bem estruturada, vibrante e inteligente, perfeitamente dentro do espírito da criação de Fleming. Mas era já tarde demais (ou cedo demais) para uma incursão realista no universo de um espião. Bond era uma fantasia masculina e era isso que as audiências pediam, assim «007 – Ao Serviço de Sua Majestade», foi durante muito tempo o mais mal-amado dos Bond. Mas o tempo veio a dar-lhe o seu devido lugar na hierarquia da saga onde hoje ombreia com os seus mais celebrados irmãos.
Como diz Lazenby na sequência de abertura do filme, onde anda à pancada com uma dupla de facínoras lusitanos: ‘Isto nunca aconteceu ao outro tipo!’
Título original: On Her Majesty’s Secret Service Realização: Peter R. Hunt Elenco: George Lazenby, Diana Rigg, Telly Savalas, Gabriele Ferzetti, Ilse Steppat, Angela Scoular, Lois Maxwell, Catherina Von Schell, George Baker, Bernard Lee, Bernard Horsfall, Desmond Llewelyn, Yuri Borienko. Duração: 142 min. Reino Unido/Suiça, 1969
Tema musical: “On Her Majesty’s Secret Service” – composição e orquestração de John Barry
“We Have All The Time In The World” – interpretada por Louis Armstrong, letra de Hal David
[Texto originalmente publicado na revista Metropolis nº2, Outubro 2012]
https://www.youtube.com/watch?v=rbeOmrpmIp0&t=1s